Em reação a críticas, presidente amputa números ruins para que eles pareçam saudáveis
A PRESIDENTE está em campanha contra o que julga ser a difamação de sua política econômica. Recheia a agenda de encontros com empresários, manda ministros se entrevistarem com outros e com jornalistas, dá safanões verbais em críticos.
Talvez mais preocupante, amputa algumas estatísticas de braços e pernas a fim de dizer que elas estão mais magras.
Dilma Rousseff acredita mesmo no que diz?
O governo do Brasil é um dos poucos, meia dúzia, daqueles dentre as grandes economias do mundo que apresenta superavit primário, diz a presidente. É. E daí?
Superavit primário é aquela parte da receita de impostos que o governo deixa de gastar; usa tais dinheiros a fim de evitar que a dívida cresça. Mesmo com essa "poupança" (o superavit primário), a dívida pública cresce. Cresce muito porque o governo do Brasil paga taxas de juros altíssimas, as maiores do mundo (e, em parte, porque o Brasil cresce pouco). Nosso caso é desgraçadamente especial.
Parte do descrédito de Dilma se deve à redução da "poupança" do governo. Não era para tanto mau humor, mas pode vir a ser.
Dados os estrambóticos juros brasileiros, o governo precisa não só fazer uma "poupança" grande (para conter o crescimento da dívida) como deveria começar a pagar parte dela, a fim de renegociar em termos mais favoráveis o resto do débito.
Isto é, para refinanciar o resto da dívida a juros menores, seria preciso um superavit maior. Tanto faz o superavit em outros países. Estamos pendurados no cheque especial; o resto do mundo está no consignado ou pega dinheiro a juro zero.
A presidente diz que a inflação vai ficar abaixo do teto da meta (abaixo de 6,5%) pelo enésimo ano. Vai. E daí?
A inflação encarece os produtos brasileiros, bidu. É bem maior aqui do que na maioria dos países com quem comerciamos (no mundo rico, está perto de zero). É fácil ver que, dada essa disparidade, vai ficando mais barato comprar importados do que produto nacional (nosso deficit externo cresce para consumirmos mais, a indústria vai à breca etc.).
Ou, então, o produtor nacional tem de segurar seus preços; dada a alta de custos, cai o seu lucro. Se lucra menos, tem menos incentivo para investir. Se a inflação não causasse outros problemas, esses já seriam bem chatinhos.
A gente pode atenuar esse problema da inflação relativamente mais alta com desvalorização da moeda. Desvalorizações constantes realimentam a inflação e, no fim das contas, achatam o poder de compra do salário, entre outros problemas.
A fim de evitar esse ciclo, é preciso elevar os juros (e/ou cortar gasto do governo), o que tolhe investimentos etc.
A presidente diz que a crise mundial afetou o Brasil. É verdade. Os excessos do final do governo Lula 2 também afetaram a economia. Críticos de Dilma diziam, desde 2010, que a tarefa da presidente seria dura. Ela é que não acreditou nisso.
Achou que o Brasil cresceria 5,9% ao ano durante seu governo. Bastava mandar pau na máquina: gastar mais, baixar imposto, soltar mais crédito. Foi o que fez.
O Brasil cresceu até agora uns 2% ao ano. Com menos superavit, mais inflação, mais deficit externo e, agora, juros em alta.
19 de novembro de 2013
Vinicius Torres Freire, Folha de São Paulo
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