"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

terça-feira, 19 de novembro de 2013

"ESTATÍSTICA SEM PÉS NEM CABEÇA'

Em reação a críticas, presidente amputa números ruins para que eles pareçam saudáveis
 

A PRESIDENTE está em campanha contra o que julga ser a difamação de sua política econômica. Recheia a agenda de encontros com empresários, manda ministros se entrevistarem com outros e com jornalistas, dá safanões verbais em críticos.
 
Talvez mais preocupante, amputa algumas estatísticas de braços e pernas a fim de dizer que elas estão mais magras.
 
Dilma Rousseff acredita mesmo no que diz?
 
O governo do Brasil é um dos poucos, meia dúzia, daqueles dentre as grandes economias do mundo que apresenta superavit primário, diz a presidente. É. E daí?
 
Superavit primário é aquela parte da receita de impostos que o governo deixa de gastar; usa tais dinheiros a fim de evitar que a dívida cresça. Mesmo com essa "poupança" (o superavit primário), a dívida pública cresce. Cresce muito porque o governo do Brasil paga taxas de juros altíssimas, as maiores do mundo (e, em parte, porque o Brasil cresce pouco). Nosso caso é desgraçadamente especial.
 
Parte do descrédito de Dilma se deve à redução da "poupança" do governo. Não era para tanto mau humor, mas pode vir a ser.
 
Dados os estrambóticos juros brasileiros, o governo precisa não só fazer uma "poupança" grande (para conter o crescimento da dívida) como deveria começar a pagar parte dela, a fim de renegociar em termos mais favoráveis o resto do débito.
 
Isto é, para refinanciar o resto da dívida a juros menores, seria preciso um superavit maior. Tanto faz o superavit em outros países. Estamos pendurados no cheque especial; o resto do mundo está no consignado ou pega dinheiro a juro zero.
 
A presidente diz que a inflação vai ficar abaixo do teto da meta (abaixo de 6,5%) pelo enésimo ano. Vai. E daí?
 
A inflação encarece os produtos brasileiros, bidu. É bem maior aqui do que na maioria dos países com quem comerciamos (no mundo rico, está perto de zero). É fácil ver que, dada essa disparidade, vai ficando mais barato comprar importados do que produto nacional (nosso deficit externo cresce para consumirmos mais, a indústria vai à breca etc.).
 
Ou, então, o produtor nacional tem de segurar seus preços; dada a alta de custos, cai o seu lucro. Se lucra menos, tem menos incentivo para investir. Se a inflação não causasse outros problemas, esses já seriam bem chatinhos.
 
A gente pode atenuar esse problema da inflação relativamente mais alta com desvalorização da moeda. Desvalorizações constantes realimentam a inflação e, no fim das contas, achatam o poder de compra do salário, entre outros problemas.
 
A fim de evitar esse ciclo, é preciso elevar os juros (e/ou cortar gasto do governo), o que tolhe investimentos etc.
 
A presidente diz que a crise mundial afetou o Brasil. É verdade. Os excessos do final do governo Lula 2 também afetaram a economia. Críticos de Dilma diziam, desde 2010, que a tarefa da presidente seria dura. Ela é que não acreditou nisso.
 
Achou que o Brasil cresceria 5,9% ao ano durante seu governo. Bastava mandar pau na máquina: gastar mais, baixar imposto, soltar mais crédito. Foi o que fez.
 
O Brasil cresceu até agora uns 2% ao ano. Com menos superavit, mais inflação, mais deficit externo e, agora, juros em alta.

19 de novembro de 2013
Vinicius Torres Freire, Folha de São Paulo

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