QUE SEJA SÓ UM COMEÇO
Depois de mais de oito anos de idas e vindas, surpresas positivas e decepções, finalmente, na semana passada, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu decretar a prisão dos réus condenados no escândalo do mensalão, a ousada operação clandestina de uso de dinheiro público e privado com o objetivo de perpetuação de uma facção no poder.
Os ministros do STF decidiram que o correto é cumprir imediatamente as sentenças ou as partes delas já definidas e contra as quais não cabem mais recursos. O desfecho do escândalo do mensalão, com a ida para a prisão dos réus, não pode ser encarado como a vitória de um partido sobre outro ou da oposição sobre o governo.
Em um país em que a corrupção vinha vencendo todas as disputas com a ética, a decência e a justiça, o significado da prisão dos mensaleiros é mais amplo, profundo e precioso.
O Brasil espera que o exemplo de cima dado pelo STF se espalhe pelas instâncias inferiores da malha jurídica nacional e que cada um de seus integrantes se sinta, a partir de agora, um soldado na luta contra a corrupção. Que os réus desse escândalo sejam não os últimos, mas os primeiros de uma nova era de tolerância zero com a ação dos corruptos.
Que seja reavivado o real significado do conceito de república, a res publica dos romanos, em que a responsabilidade de cada um tem de ser sempre maior quando o bem é de todos. Isso é o reverso da cínica atitude que tristemente prevalece no Brasil, com as honrosas exceções de sempre, segundo a qual o que é de todos não é de ninguém — ou, pior ainda, é de quem pegar primeiro.
Que o caso do mensalão entre para a história do Brasil como o marco inaugural de uma nova etapa na dura caminhada civilizatória dos brasileiros.
O episódio deve ser lembrado como a pedra fundamental da institucionalização das virtudes republicanas no Brasil. Assim, com certeza, a Justiça não precisará mais de oito longos anos para punir corruptos pegos em flagrante. Assim, as boas causas poderão triunfar não mais pelo caráter de um ou outro magistrado ou graças ao voluntarismo de um servidor público extremado no cumprimento de seus deveres, mas pela existência de instituições sólidas, funcionais e independentes dos interesses individuais ou de grupos.
19 de novembro de 2013
Ricardo Setti - Veja
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