"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

domingo, 11 de fevereiro de 2018

PELO FIM DO CONLUIO ENTRE A JUSTIÇA E O PODER


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Charge do Benett (Arquivo Google)
Nos trinta anos seguintes à Revolução de 25 de abril de 74, considerava-se normal em Portugal  o arquivamento, pelo Judiciário, de inquéritos sobre crimes de corrupção, tráficos de influência e econômicos, envolvendo políticos ou não. Para evitar que essas investigações chegassem a uma condenação, alegava-se tudo e mais alguma coisa. Falta de provas e até de previsão legal que punisse os delitos investigados. E os acusados escapavam livres, leves e soltos. Apenas os furtos, homicídios e outros crimes clássicos eram punidos, sobretudo quando praticados pelos mais desfavorecidos.
Enquanto isso, em diversos tribunais, sem recursos materiais e humanos, magistrados mais jovens faziam o possível para evitar a prescrição da maioria das investigações sobre esses delitos,  todos  comprometendo dinheiro público. Nessa altura, não havia sequer previsão legal para o crime de lavagem de dinheiro. Não houve contestação relevante por parte da sociedade portuguesa, o que permitiu à vida política mover-se com desenvoltura no terreno das contravenções.
DESCONTENTAMENTO – Em razão desse conluio entre a justiça e acusados e da complacência das elites portuguesas com a situação, as relações entre alguns juízes e a classe política começaram a trincar, agravando-se o descontentamento com a permissividade no Poder Judiciário. O primeiro sinal de mudança ocorreu em 2014, com a prisão do ex-primeiro-ministro José Socrates, acusado de corrupção passiva, fraude fiscal, lavagem de dinheiro e outros graves delitos, decretada pelo Juiz Carlos Alexandre.
Há grande expectativa com relação ao desfecho desse processo, que deve ocorrer ainda este semestre. Observadores avaliam que a sentença funcionará com uma bússola, indicando se a mudança no Judiciário veio ou não para ficar. Como Socrates já passou nove meses na cadeia de Évora, uma decisão considerando que ele já  cumpriu pena suficiente representaria a vitoria do sistema até então vigente. Já sua condenação a mais tempo na prisão sinalizaria que o Judiciário está emancipando-se das antigas amarras.
BANQUEIRO NA CADEIA – No ano seguinte, pelos mesmos delitos e mais outros tantos, o juiz Carlos Alexandre fez o que nenhum magistrado português antes seria capaz de conceber. Mandou para prisão domiciliar o mais importante banqueiro do país, Ricardo Salgado, Presidente do Banco Espírito Santo e sobre quem se dizia ser “dono disso tudo”, referindo-se ao seu poder de influência nas áreas mais importante da vida nacional. Por isso, o juiz é chamado do Sergio Moro português.
Na seqüência desses processos, está em curso importante investigação envolvendo dois juízes do Tribunal da Relação , os desembargadores Rui Rangel  e Fátima Galante,sua ex-mulher, cuja posse no Supremo Tribunal de Justiça, marcada para o dia 6 passado,foi suspensa. No total, 13 conhecidas figuras da vida pública portuguesa foram interrogadas e cinco acabaram detidas. Entre os envolvidos, o mediático Presidente do Benfica, Luis Filipe Vieira, dirigentes do clube e da Federação Portuguesa de Futebol, diversos advogados, empresários e até um banqueiro, Álvaro Sobrinho.
PROPINAS AO JUIZ – O desembargador Rui Rangel é acusado de usar a toga para favorecer personalidades do mundo do futebol em troca de favores judiciais e teria recebido pelo menos 400 mil euros. Durante meses, os dois desembargadores foram vigiados, suas contas bancárias escrutinadas e seus telefones colocados sob escuta judicial.
Os indícios recolhidos levaram os investigadores a concluir que Rangel terá montado, com ajuda da ex-mulher, sofisticada máquina de favorecimentos na magistratura para beneficiar os demais acusados. Foi a primeira vez que isso aconteceu em Portugal, mas há sempre uma primeira vez para estancar o mal.
Ambos foram suspensos de suas funções e só não foram presos devido à normas do Estatuto dos Magistrados Judiciais que impede a detenção de juízes fora do flagrante delito. Levados para depor no STJ, ficaram em silêncio. Para justificar a atitude, seus advogados alegaram que o Juiz da Instrução não concedeu tempo suficiente para consulta aos elementos de provas que servem de base às acusações feitas pelo Ministério Público.
Na próxima quarta-feira, será divulgada a pena a que serão sujeitos. Comprovadas as acusações, julgados e condenados, irão diretos para a cadeia.
E NO BRASIL? – A mudança que vem ocorrendo em Portugal remete ao que se passa no Brasil, onde não custa perguntar a quem servem juízes que pedem vistas e sentam-se em cima de processos, permitindo  que a prescrição impeça a condenação de personagens poderosos? Esses juízes servem ao Estado ou ao estado de coisas que transformou a política brasileira num pântano? A exemplo de Portugal nas últimas três décadas, esses estranhos pedidos de vistas por parte de ministros dos Tribunais Superiores no Brasil, com medidas protelatórias, alegações de falta de provas ou de previsão legal que sancione os comportamentos investigados, liberação de condenados – tudo isso vem construindo uma Justiça especial na última instância do Poder Judiciário brasileiro. Isso acontece com alguma ajuda, naturalmente, de parte da nata da advocacia brasileira, que tenta manipular e adulterar fatos em favor de clientes acusados de crimes contra o conjunto da nação.
É claro que todos têm direito à defesa, mas quando os causídicos sustentam a inocência desses clientes, na qual provavelmente  nem acreditam, ganham fama e dinheiro, mas desprestigiam sua categoria profissional. Advogados que mentem, distorcem e não respeitam a verdade dos acontecimentos, sem dúvida ajudam a diminuir a justiça. Mais do que isso,tornam-se cúmplices dos criminosos. Se em Portugal está havendo uma mudança para melhor, porque não lutar pelo mesmo no Brasil? (artigo enviado por Jorge Béja e João Amaury Belem)

11 de fevereiro de 2018
Silvia Caetano
Diário do Poder

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