A virtual ausência de conflitos entre Estados nacionais, ainda que haja questões fronteiriças irresolutas aqui e ali, sempre deu à América do Sul o status de área pacífica em fóruns internacionais.
Obviamente a designação é vazia quando um país como o Brasil tem mais baixas em sua guerra urbana (60 mil homicídios ao ano) do que qualquer outro país do mundo e a Colômbia apenas agora está encerrando 50 anos de um brutal conflito interno.
O recrudescimento da crise na Venezuela, contudo, insere um elemento inédito de instabilidade. A última guerra de fato por aqui foi um breve conflito entre Peru e Equador em 1995. Além da já citada situação colombiana, há também espasmos de violência na perene instabilidade política do Paraguai. Agora é diferente.
Como relataram oficiais colombianos a seus pares sul-americanos em encontros recentes, há três opções realistas na mesa hoje: a ditadura de Maduro reprimir a oposição e manter a Assembleia Constituinte operante, uma guerra civil ou as duas alternativas anteriores combinadas. Eles apostam no último cenário.
Com isso, como a Folha relatou neste sábado (5), o país vizinho já espera a chegada de até 2 milhões de venezuelanos, um movimento que nunca houve.
Além disso, dono da segunda maior fronteira com a Venezuela, o Brasil poderá ter de enfrentar não só a questão humanitária, mas eventuais transbordamentos de violência e ações armadas em seu território.
Se a ditadura se mantiver em pé, o cenário é ainda mais confuso, pois será um regime abertamente contrariado com seus vizinhos. Escaramuças de fronteira podem se tornar recorrentes, e o intercâmbio nas regiões vizinhas será afetado.
Retaliações de todo tipo podem acontecer, sejam contra os cerca de 30 mil brasileiros que vivem na Venezuela, sejam relacionadas aos diversos interesses empresariais do Brasil lá.
Nada é preto no branco, como a seletividade dos Estados Unidos em não sancionar atividades relacionadas ao petróleo venezuelano que compra indica.
Mas o sinal é de conflito aberto, como a suspensão que na prática significa expulsão exceto que Maduro ceda e desista de seu projeto ditatorial, o que parece no mínimo improvável.
Naturalmente, o ditador pode torcer para que o PT volte ao poder federal em 2018, uma vez que o partido de Luiz Inácio Lula da Silva legitima e apoia o regime chavista. Mesmo nesse cenário, não é factível pensar que o Brasil romperia com a decisão do Mercosul unilateralmente.
A decisão do bloco de isolar Maduro é a última cartada diplomática contra o regime, mas o histórico sugere que o ditador não vai largar o osso tão facilmente. A instabilidade, agora paroxística, veio para ficar.
09 de agosto de 2017
Igor Gielow, Folha de SP
Obviamente a designação é vazia quando um país como o Brasil tem mais baixas em sua guerra urbana (60 mil homicídios ao ano) do que qualquer outro país do mundo e a Colômbia apenas agora está encerrando 50 anos de um brutal conflito interno.
O recrudescimento da crise na Venezuela, contudo, insere um elemento inédito de instabilidade. A última guerra de fato por aqui foi um breve conflito entre Peru e Equador em 1995. Além da já citada situação colombiana, há também espasmos de violência na perene instabilidade política do Paraguai. Agora é diferente.
Como relataram oficiais colombianos a seus pares sul-americanos em encontros recentes, há três opções realistas na mesa hoje: a ditadura de Maduro reprimir a oposição e manter a Assembleia Constituinte operante, uma guerra civil ou as duas alternativas anteriores combinadas. Eles apostam no último cenário.
Com isso, como a Folha relatou neste sábado (5), o país vizinho já espera a chegada de até 2 milhões de venezuelanos, um movimento que nunca houve.
Além disso, dono da segunda maior fronteira com a Venezuela, o Brasil poderá ter de enfrentar não só a questão humanitária, mas eventuais transbordamentos de violência e ações armadas em seu território.
Se a ditadura se mantiver em pé, o cenário é ainda mais confuso, pois será um regime abertamente contrariado com seus vizinhos. Escaramuças de fronteira podem se tornar recorrentes, e o intercâmbio nas regiões vizinhas será afetado.
Retaliações de todo tipo podem acontecer, sejam contra os cerca de 30 mil brasileiros que vivem na Venezuela, sejam relacionadas aos diversos interesses empresariais do Brasil lá.
Nada é preto no branco, como a seletividade dos Estados Unidos em não sancionar atividades relacionadas ao petróleo venezuelano que compra indica.
Mas o sinal é de conflito aberto, como a suspensão que na prática significa expulsão exceto que Maduro ceda e desista de seu projeto ditatorial, o que parece no mínimo improvável.
Naturalmente, o ditador pode torcer para que o PT volte ao poder federal em 2018, uma vez que o partido de Luiz Inácio Lula da Silva legitima e apoia o regime chavista. Mesmo nesse cenário, não é factível pensar que o Brasil romperia com a decisão do Mercosul unilateralmente.
A decisão do bloco de isolar Maduro é a última cartada diplomática contra o regime, mas o histórico sugere que o ditador não vai largar o osso tão facilmente. A instabilidade, agora paroxística, veio para ficar.
09 de agosto de 2017
Igor Gielow, Folha de SP
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