"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quinta-feira, 10 de novembro de 2016

VIOLÊNCIA E PARECERES SÃO ARMAS CONTRA O NECESSÁRIO AJUSTE

Justiça e MP também lutam a fim de barrar o pacote, em nome de ‘direitos’. Mas sucede que não há dinheiro para pagar salários, aposentadorias e adicionais

Por inevitável, a crise fiscal fluminense chegou às ruas, e da pior maneira possível, com a invasão da Assembleia Legislativa (Alerj), terça, por servidores, basicamente policiais e bombeiros, para pressionar a Casa a não examinar o pacote de medidas de ajuste enviado pelo Executivo. Ontem, a cena se repetiu, mas os manifestantes, de várias categorias, foram impedidos de invadir o Palácio Tiradentes. É inconcebível o uso da força contra o Legislativo ou qualquer outro poder. Esses conflitos expressam a irritação do funcionalismo com as medidas de austeridade. Mas não há alternativa, pois é a folha de salários e principalmente aposentadorias e outros benefícios que mais pesam nas despesas primárias do estado.

Tem razão o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, ao citar a crise fluminense como argumento a favor da aprovação pelo Congresso das reformas, a começar pela PEC do teto e a da Previdência. Sem mudanças na Previdência, por exemplo, haverá atrasos no pagamento de benefícios, e as alíquotas de contribuição também terão de ser aumentadas. Como em terras fluminenses. A não ser que o governo federal opte pelo caminho mais fácil, porém que leva à hecatombe econômica: mais dívida pública, já muito elevada.

Há mais corporações, grupos organizados, dentro da máquina pública atuando contra as medidas. Apenas sem invadir prédios públicos. A união entre a Justiça e o Ministério Público fluminenses, contra o pacote sob exame da Alerj, é emblemática.

Do ponto de vista formal, pareceres jurídicos contra o ajuste estão dentro dos marcos legais. Na prática, estão a serviço de interesses e benefícios corporativos, alguns deles privilégios injustificáveis. Basta consultar listas de adicionais e extras pagos na Justiça, MP, Tribunal de Contas etc.

Cada um, na máquina estatal, defende a sua fatia no bolo das receitas. Sucede que esse bolo está esvaziando, devido à recessão e à ausência de medidas para cortar despesas e aumentar receitas que não sejam pela via esgotada dos impostos. E quando propostas são feitas, tribunais as barram. Aconteceu ontem com a alíquota adicional de contribuição para reduzir o déficit da previdência dos servidores.

A Justiça vem, ainda, concedendo liminares para arresto de recursos no Tesouro estadual, com base na correta defesa de “direitos”. Mas acabou o dinheiro. O dilema de Pezão: “Há 438 mil funcionários ativos e inativos que consomem toda a arrecadação, enquanto tenho 16 milhões de pessoas que querem mais saúde, mais educação, mais segurança, e eu não posso contratar um PM”.

Em visita ao Supremo, à presidente Cármen Lúcia, Pezão pediu pressa no julgamento final das ações contra os arrestos. O melhor é mesmo que reclamações corporativas cheguem ao STF, onde deverá ser decidido sobre o poder de o Executivo e Legislativo traçarem planos racionais de combate à crise, em que sempre haverá perdedores, dada a gravidade da conjuntura.

“Direitos” não estão sendo atendidos por falta de recursos. Não é difícil entender. Ou não deveria sê-lo. A alternativa é deixar a hiperinflação fazer um ajuste selvagem, destruindo a moeda. Isso aconteceu há quase uma geração. E os sobreviventes sabem que aí, sim, o povo de fato pagará a maior parte da conta.



10 de novembro de 2016
Editorial O Globo

Nenhum comentário:

Postar um comentário