"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

domingo, 28 de agosto de 2016

LÓGICA NO HOSPÍCIO

Em meio aos tumultos no início do julgamento da presidente afastada Dilma Rousseff (PT) no Senado Federal, veio do presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), o aviso mais eloquente.

Foram tantas invectivas e questões de ordem, tantos brados e recursos, que as primeiras sessões da deliberação final sobre o impeachment transmitiam, segundo o peemebebista, a sensação de realizar-se num "hospício".

Verdade que nem ele mesmo resistiu à tentação de contribuir para incendiar os ânimos. Chamou a si os méritos pela suspensão, no STF, do indiciamento criminal de sua colega Gleisi Hoffmann (PT-PR) na Operação Custo Brasil.

Como era de prever, a petista reagiu com veemência a Renan Calheiros —que, por sua vez, escalava a retórica contra considerações anteriores da senadora. Para a parlamentar paranaense, o Senado não tinha condições morais de julgar Dilma Rousseff, dada a alta proporção de suspeitos de irregularidades entre seus integrantes.

Hospício? Embora levados a extremos de exaltação, os senadores em nenhum momento abandonaram o frio cálculo da conveniência política. Estando quase definido, há tempos, um resultado desfavorável a Dilma Rousseff, sem dúvida o PT e seus aliados almejam tirar o máximo proveito da ocasião.

Não se trata, por certo, de confiar numa possível anulação do processo, ou de alguma expectativa realista de que venha a adiar-se. A estratégia é fazer crer, com grande estridência, na versão de que Dilma Rousseff tornou-se vítima de uma "conspiração das elites" —desviando a atenção de tudo o que trouxe de incompetência, de irresponsabilidade e de malogro.

Concorre para o clima carregado, ademais, o longo decurso do processo. Repetiram-se, esmiuçaram-se e esgotaram-se os argumentos que fundamentariam juridicamente a acusação contra Dilma Rousseff. Como uma estrela que alcança seu máximo de irradiação antes de extinguir-se, o debate sobre o impeachment lança seus derradeiros meteoros, agora que só resta a cada senador mostrar-se mais firme do que os rivais ao expressar as próprias convicções.

"Hospício" ou não, o Senado —o país inteiro— tem de lidar com uma característica de desequilíbrio no processo do impeachment. O aspecto político torna insustentável a permanência de Dilma Rousseff, enquanto que, do ponto de vista jurídico, as argumentações de um lado e de outro permanecem abertas à dúvida e ao debate.

A realidade política concreta, todavia, se impõe sobre a retórica e o desespero; é hora de o julgamento, e com ele a crise, chegar a um pacífico desfecho.



28 de agosto de 2016
Editorial Folha de SP

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