"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 3 de junho de 2015

DESENVOLVIMENTO COMO MITO, NA VISÃO DE CELSO FURTADO



Desenvolver não significa diminuir desigualdades, afirmou Furtado
















Em 1974, Celso Furtado escreveu um pequeno livro que ainda hoje impressiona pela sua capacidade crítica em relação a um dos fundamentos da noção econômica de progresso. Nele, a própria noção de desenvolvimento econômico era descrita como um “mito”.
Furtado se bateu constantemente contra a maneira com que a visão do desenvolvimento se circunscrevia à lógica dos meios, ou seja, como a simples ampliação quantitativa do “crescimento”, do “investimento”, da “exportação” nunca nos levaria a uma real transformação. Daí por que ele dizia que a fixação em tal mito do desenvolvimento econômico era responsável pela paralisia da criatividade social.
Nesse contexto, “criatividade” significava a capacidade de transformar globalmente o horizonte do progresso da vida social, colocando em questão meios e fins para abrir o espaço à constituição de novas formas de vida.
FOI SÓ UM MITO?
Agora, no momento em que o Brasil termina um ciclo de desenvolvimento que teria durado uma década e recebeu o nome de “lulismo”, é salutar voltar os olhos à teoria de Celso Furtado a fim de se perguntar se, afinal de contas, ela não foi a mais bem acabada expressão de um “mito”.
Não se trata aqui de negar como, no final de 2010, assistimos a fenômenos como a ascensão social de 42 milhões de pessoas com sua ampliação da capacidade de consumo, a elevação do salário mínimo a 50% acima da inflação, entre outros.
Mas trata-se de perguntar se a circunscrição do pretenso sucesso do modelo econômico lulista à tal “lógica dos meios” não expressa claramente a incapacidade de setores hegemônicos da esquerda brasileira de assumir como tarefa maior a crítica do mito de desenvolvimento econômico e a absorção da “criatividade social” como conceito fundamental para a definição do que pode ser entendido como “progresso”.
CONTINUAM DESIGUAIS
Por exemplo, é claro que o que vimos no lulismo não foi o combate à desigualdade, mas a capitalização dos setores mais pobres da população, o que é muito diferente. Os rendimentos dos mais ricos continuaram aumentando, mesmo que os mais pobres tenham sido relativamente capitalizados. Com isso, os rendimentos dos mais ricos puxaram preços para cima, transformando São Paulo e Rio em algumas das cidades mais caras do mundo. Isso corroeu o ganho dos mais pobres, fazendo com que as conquistas do modelo rapidamente se esvaíssem, como vemos agora.
Por não ter pensado o desenvolvimento fora da chave de sempre, o lulismo foi mais um capítulo de um mito que a própria esquerda brasileira havia diagnosticado há 40 anos.

(artigo enviado pelo comentarista Mário Assis)

03 de junho de 2015
Vladimir Safatle
Folha

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