"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 11 de março de 2015

JANOT E ZAVASCKI ERRARAM FEIO AO BLINDAR DILMA ROUSSEFF (ERRARAM?!)



Não há dúvida de que, ao excluírem a possibilidade de abertura de inquérito contra a presidente Dilma Rousseff, tendo como único argumento o parágrafo 4º do artigo 86 da Constituição Federal, tanto o procurador-geral Rodrigo Janot quanto o ministro-relator Teori Zavascki cometeram um grande erro judiciário.
O motivo, que vem sendo desprezado no vasto noticiário a respeito do assunto, é muito simples – não cabe nem ao procurador-geral da República nem a nenhum ministro do Supremo interpretar normas legais em que haja dúvidas sobre sua aplicabilidade, seja por má redação ou por anacronismo.
Somente o plenário do Supremo, integrado por todos os integrantes, pode interpretar dispositivos legais duvidosos e fixar jurisprudência. Ministros-relatores, é claro, rotineiramente apresentam pareceres que firmam jurisprudência quando aprovados, mas seus acórdãos não têm a força de uma decisão do tribunal pleno.
VEJAM A JURISPRUDÊNCIA
O art. 86, § 4º foi inserido na Constituição antes de existir reeleição para cargos executivos,  e jamais houve acórdão e jurisprudência a respeito. A única referência até hoje é Inquérito 672-QO, que teve como relator o ministro Celso de Mello, num julgamento pelo plenário em 16 de setembro de 1992. Vamos, então, conferir o acórdão.
O art. 86, § 4º, da Constituição, ao outorgar privilégio de ordem político-funcional ao presidente da República, excluiu-o, durante a vigência de seu mandato – e por atos estranhos ao seu exercício –, da possibilidade de ser ele submetido, no plano judicial, a qualquer ação persecutória do Estado.
A cláusula de exclusão inscrita nesse preceito da Carta Federal, ao inibir a iniciativa do Poder Público em sede judicial, alcança as infrações penais comuns praticadas em momento anterior ao da investidura no cargo de chefe do Poder Executivo da União, bem assim aquelas praticadas na vigência do mandato, desde que estranhas ao ofício presidencial. (…)
Mas o presidente da República não dispõe de imunidade, quer em face de ações judiciais que visem a definir-lhe a responsabilidade civil, quer em função de processos instaurados por suposta prática de infrações político-administrativas, quer, ainda, em virtude de procedimentos destinados a apurar, para efeitos estritamente fiscais, a sua responsabilidade tributária.
O chefe de Estado, nos ilícitos penais praticados in officio ou cometidos propter officium, poderá, ainda que vigente o mandato presidencial, sofrer a persecutio criminis, desde que obtida, previamente, a necessária autorização da Câmara dos Deputados.”  
NÃO HÁ IMUNIDADE
O relator Celso de Mello, portanto, teve o cuidado de fazer uma importante ressalva, ao destacar que “presidente da República não dispõe de imunidade, quer em face de ações judiciais que visem a definir-lhe a responsabilidade civil, quer em função de processos instaurados por suposta prática de infrações político-administrativas, quer, ainda, em virtude de procedimentos destinados a apurar, para efeitos estritamente fiscais, a sua responsabilidade tributária”.
E o ministro termina o acórdão assinalando que, ao contrário, presidente da República pode ser submetido a inquérito, inclusive por atos cometidos fora da função, desde que se obtenha “a necessária autorização da Câmara dos Deputados”.
IMUNIDADE CONCEDIDA
No caso da chamada lista de Janot, o procurador-geral excluiu a presidente Dilma alegando que há “vedação constitucional”, porque os atos criminosos foram cometidos antes do atual mandato dela. Acontece que esta “vedação constitucional” não existe nem jamais existiu. O acórdão do Supremo é claro. A Constituição não veda nada, apenas exige que a Câmara autorize a abertura do inquérito.
Isso significa que o procurador Janot não conferiu a jurisprudência existente e o ministro Zavascki também não se deu a este trabalho. Liminarmente, excluíram de inquérito a presidente da República. Concederam a ela a “imunidade” que o ministro Celso de Mello e o plenário do Supremo concluíram que não existe. Ou seja, contornaram habilmente a jurisprudência, e estamos conversados.
A função deles era apenas verificar se havia base para abertura de inquérito contra a presidente. Se houvesse, teriam de pedir autorização à Câmara, na forma da lei. Mas extrapolaram da função e interpretaram uma lei anacrônica, totalmente fora de época.
REINTERPRETAÇÃO
Se estivéssemos num país sério, o plenário do Supremo deveria agora reinterpretar o art. 86, § 4º, para fixar sua aplicabilidade, pois a ocorrência de reeleição representou um fato novo em relação ao objetivo anterior do dispositivo constitucional. Mas quem se interesse em obedecer a lei e adaptá-la aos novos tempos?
Bem, pelo menos o juiz federal Sérgio Moro parece se interessar, e agora ele vai investigar Vaccari, Palocci, Dirceu, Dilma e Lula, com total liberdade e autonomia, sem precisar se submeter a Janot nem a Zavascki, que estranhamente mandou libertar o ex-diretor Renato Duque, um dos chefes da quadrilha montada na Petrobras, e tudo ficou por isso mesmo. Portanto, vamos aguardar. A novela do impeachment está apenas começando.

11 de março de 2015
Carlos Newton

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