Os colegas de partido insistem na renúncia, mas apenas por causa do dano que a permanência do deputado na Câmara provoca às candidaturas petistas
O deputado André Vargas (PT-PR) causou nesta semana uma decepção a todos que esperavam pelo seu gesto final e dramático – o de renunciar ao mandato. Depois de dar como praticamente certa sua saída, em entrevista na segunda-feira, ele preferiu adiar a decisão, confuso sobre o que fazer em razão das dúvidas jurídicas sobre a validade do ato de renúncia. Ao se convencer de que sua saída não interromperia o processo de cassação, Vargas disse aos companheiros de partido que fica. Nem os petistas, no entanto, parecem estar muito felizes com a decisão.
Não é a primeira decepção causada pelo parlamentar paranaense. Ele já se notabilizara antes quando, na condição de secretário nacional de Comunicação do PT, advogava o controle social da mídia – eufemismo utilizado pelo partido para não revelar claramente sua intenção de impor censura seletiva à imprensa. Depois, já eleito vice-presidente da Câmara, cometeu o acinte de provocar o presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, ao repetir o punho erguido com que os mensaleiros levados à prisão pelo Supremo pretenderam manifestar orgulho.
Por fim, nos últimos dias, soube-se das estreitas ligações de Vargas com um doleiro enrolado em traficâncias para subtrair dinheiro público e que, gentilmente, lhe proporcionara viagem de férias no jatinho particular. O deputado e o doleiro, segundo diálogo gravado pela Polícia Federal, planejavam conquistar a “independência financeira”. O conjunto da obra, mal e contraditoriamente explicado pelo deputado em ocasiões distintas, caracterizou a possível quebra de decoro parlamentar, punível com a cassação.
O que fez o PT neste meio tempo? Fez o de sempre: tentou tirar o bode da sala de modo a evitar que o mau cheiro crescente passasse a afetar os projetos do partido de reeleger a presidente Dilma Rousseff e eleger alguns dos candidatos a governos estaduais, dentre os quais a senadora paranaense Gleisi Hoffmann, ex-chefe da Casa Civil da Presidência, já em campanha para conquistar o Palácio Iguaçu. É apenas isso (e não um suposto surto de respeito à ética) que explica a insistência do deputado paulista Vicentinho, líder do PT na Câmara, e do presidente da legenda, Rui Falcão, para que Vargas renuncie. Vicentinho diz que seu colega devia sair de cena para ele “não ter de ficar sangrando permanentemente”. Mas a verdade é que, enquanto Vargas insistir, é o PT que sangra.
Semelhante comportamento o PT adotou no passado quando, diante do escândalo do mensalão, chegou a expulsar de suas fileiras seu ex-tesoureiro Delúbio Soares. A punição durou tempo suficiente para que as ondas de indignação serenassem e permitissem – como de fato aconteceu – a readmissão festiva de Delúbio aos seus quadros. Seus companheiros de jornada José Dirceu, José Genoino e João Paulo Cunha, mesmo tendo condenação em caráter definitivo pelo Supremo, não foram expulsos do partido, como prevê o estatuto do PT.
A ascensão e queda de Vargas, que até há pouco era cotado para se tornar presidente da Câmara em 2015, criou um problema interno para o PT. O deputado foi aconselhado com incrível rapidez a se afastar das posições proeminentes que ocupava, de preferência sem deixar pegadas comprometedoras que, seguidas, podem levar os investigadores a patamares políticos mais altos. Vargas sentiu logo o terreno em que pisava: deixou a vice-presidência da Câmara e anunciou sua disposição de renunciar ao próprio mandato, decisão da qual recuou ao contabilizar melhor as perdas e danos. Agora, Falcão ameaça até abrir processo na Comissão de Ética do PT. Caso a pressão fique insustentável e Vargas decida mesmo renunciar, resta-lhe um consolo: se ele olhar para os mensaleiros, perceberá que o PT recompensa bem aqueles que se sacrificam pelo partido.
19 de abril de 2014
Editorial Gazeta do Povo-PR
Nenhum comentário:
Postar um comentário