Um escândalo generalizado invadiu as páginas dos jornais com o escândalo da preservação de mandato do deputado Natan Donadon, condenado a 13 anos de prisão, pelos crimes de formação de quadrilha e peculato. E já na prisão – detalhe importante neste país em que ser condenado por um crime não significa necessariamente ir para a prisão.
Veja berra na capa desta semana:
Vergonha! - A preservação do mandato do presidiário Natan Donadon agride a democracia e pode criar a "bancada da penitenciária!" no Congresso
Para a revista, chegamos ao fundo do poço:
"Se, como se diz, a cada quinze anos o Brasil deleta a própria memória e formata o disco rígido, nunca é demais relembrar o rico repertório de truques dos políticos para assaltar os cofres públicos. No escândalo dos anões do Orçamento flagrado no começo da década de 90, um grupo de tampinhas físicos e morais cobrava propinas para favorecer interesses na elaboração da peça orçamentária federal. O golpe principal dos deputados sanguessugas, que estourou em 2006, consistia em embolsar dinheiro destinado à compra de ambulâncias. O esquema abrangente do mensalão do PT e de sua base aliada ainda está fresco na memória e, por sua ousadia e pelo elenco de crimes, ficará imortalizado na história dos subterrâneos da política brasileira.
Mas, como se sabe, esse poço não tem fundo. Sempre se pode cavar mais. Foi exatamente o que os mensaleiros petistas e seus aliados fizeram na semana passada, em Brasília, com a criação de uma entidade inédita na política brasileira e — quem sabe — mundial: o deputado-presidiário.
Pelo jeito, a revista não se preocupou em pesquisar muito. Para Elio Gaspari, na Folha de São Paulo de hoje, “há precedentes de diversos países e nos Estados Unidos chegou-se a situações ainda mais esquisitas. Dois deputados foram reeleitos enquanto estavam na cadeia. Um deles, depois de solto, assumiu a cadeira e deu o voto que garantiu a presidência a Thomas Jefferson. Um terceiro, Jay Kim, condenado a um ano de prisão domiciliar em 1988, ia ao Congresso com uma pulseira eletrônica, sabendo que sua rotina seria de lá para casa”.
Quer dizer, se nos Estados Unidos já houve deputado-presidiário, então a pátria está salva.
Joaquim Barbosa, o catão tupiniquim, considerou “incongruência constitucional” e "impasse constitucional absurdo" a decisão da Câmara dos Deputados de manter o mandato do colega presidiário. Ora, Barbosa preside a corte que aplainou caminho para a manutenção do mandato, ao delegar ao Congresso esta tarefa, há três semanas. Se delegou, é claro que admitia a hipótese desta votação.
"Quando nós julgamos, no ano passado e neste ano, eu disse claramente que seria uma incongruência muito grande manter no Congresso um parlamentar condenado e, mas o Congresso Nacional é soberano – disse o ministro - . Tomou a decisão e terá que lidar com as consequências desse ato a cumprir pena. Lamento muito que estejamos hoje diante desse impasse constitucional absurdo", afirmou.
Na verdade, está passando a bola à frente. Quem abriu as portas – e teria de lidar com as consequências do ato foi o STF. Longe de mim defender um deputado corrupto. Aliás, não defendo nem deputado honesto. Mas sempre é conveniente bancar o advogado do diabo. Que há de errado na figura do deputado-presidiário? Como vimos – e como o STF autorizou – ilegal não é. É anti-ético? Que seja. Ética não tem força de lei. A propósito, que preconceito é esse de falar em presidiário? O ministro Marco Aurélio Mello é mais adequado a estes tempos politicamente corretos: "Os reeducandos da Papuda estão homenageados com a presença de um deputado federal”.
Reeducando-deputado, portanto. Soa melhor e fere menos a dignidade do Congresso. É mais uma jabuticaba da política nacional? Pelo visto não é. O que é bom para os Estados sempre foi bom para o Brasil.
Diz nosso código no artigo primeiro da Lei de Execução Penal:
“Art 1º- Execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado.”
Em artigo assinado por uma plêiade de juristas (Manoel Valente Figueiredo Neto, Yasnaya Polyanna Victor Oliveira de Mesquita, Renan Pinto Teixeira, Lúcia Cristina dos Santos Rosa), no site ambito-juridico.com.br, leio:
De acordo com o artigo supramencionado percebe-se a dupla finalidade da execução penal qual seja, dar sentido e efetivação do que foi decidido criminalmente além de dar ao apenado condições efetivas para que ele consiga aderir novamente ao seio social e assim não cair nas antigas malhas do crime.
A reinserção social tem como objetivo a humanização da passagem do detento na instituição carcerária, procura dar uma orientação humanista colocando a pessoa que delinqüiu como centro da reflexão cientifica.
Empunhando a Declaração Universal dos Direitos do Homem em seu artigo 1º - “Todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade” - os autores afirmam:
De acordo com o vemos em tal declaração é importante destacar que o apenado cometeu um erro, deve arcar com suas conseqüências, mas não pode ser esquecido que enquanto ser humano, deve ser tratado com humanidade e com condições para que voltando à sociedade não volte a vida que tinha, a vida de criminalidade.
O Prof. Zacarias (2006, p. 61) ressalta que:
“O trabalho é importante na conquista de valores morais e materiais, a instalação de cursos profissionalizantes possibilita a resolução de dois problemas, um cultural e outro profissional. Muda o cenário de que a grande maioria dos presos não possui formação e acabam por enveredar, por falta de opção, na criminalidade e facilitam a sua inserção no mercado de trabalho, uma vez cumprida a pena.”
Ora, o deputado Donadon apenas cometeu um erro – ou um malfeito, como diria a presidente – e não pode ser esquecido enquanto ser humano. Deve ser tratado com humanidade e com condições para que voltando à sociedade não volte a vida que tinha, a vida de criminalidade. É claro que o reeducando Donadon, após os dois meses em que comeu mal na Papuda, jamais voltaria à vida que tinha.
Mantendo seu mandato, jamais acabaria por enveredar, por falta de opção, na criminalidade e sua inserção no mercado de trabalho seria dispensável, já que não perdeu seu emprego.
Deputado-presidiário – perdão, deputado-reeducando – ainda não vi no Brasil. Mas já vi funcionário público preso e batendo ponto. Nos anos 80, em Porto Alegre, houve o caso sui generis de um fiscal da Receita Federal condenado e preso por corrupção. Como o Direito Administrativo é ainda mais lento que o Penal, mesmo condenado não havia sido demitido do serviço público. Todos os dias, sob escolta, era levado à sua repartição para continuar exercendo suas funções.
Fora do serviço público, na mesma Porto Alegre, tivemos o caso do jornalista Flávio Alcaraz Gomes. Condenado por ter detonado a calota craniana de uma universitária, foi demitido de sua empresa, a Caldas Júnior, e acolhido pela RBS. Ao ser condenado, continuou trabalhando como repórter em sua cela. Teve inclusive a oportunidade de colocar no ar uma sessão de tortura.
Confesso nada ver de insólito na figura de um deputado que de dia brande o verbo na Câmara e à noite volta para trás das grades. Ilegal não é. Inédito, tampouco. Está ganhando muito? Fez por merecer: concorreu ao cargo e foi eleito. Se alguma culpa existe, está no voto de seus eleitores. Que também guindaram à deputação Zé Dirceu, José Genoíno, João Paulo Cunha e demais mensaleiros. E se o eleitor quer, que fazer?
Afinal, vivemos numa democracia.
01 de setembro de 2013
janer cristaldo
Veja berra na capa desta semana:
Vergonha! - A preservação do mandato do presidiário Natan Donadon agride a democracia e pode criar a "bancada da penitenciária!" no Congresso
Para a revista, chegamos ao fundo do poço:
"Se, como se diz, a cada quinze anos o Brasil deleta a própria memória e formata o disco rígido, nunca é demais relembrar o rico repertório de truques dos políticos para assaltar os cofres públicos. No escândalo dos anões do Orçamento flagrado no começo da década de 90, um grupo de tampinhas físicos e morais cobrava propinas para favorecer interesses na elaboração da peça orçamentária federal. O golpe principal dos deputados sanguessugas, que estourou em 2006, consistia em embolsar dinheiro destinado à compra de ambulâncias. O esquema abrangente do mensalão do PT e de sua base aliada ainda está fresco na memória e, por sua ousadia e pelo elenco de crimes, ficará imortalizado na história dos subterrâneos da política brasileira.
Mas, como se sabe, esse poço não tem fundo. Sempre se pode cavar mais. Foi exatamente o que os mensaleiros petistas e seus aliados fizeram na semana passada, em Brasília, com a criação de uma entidade inédita na política brasileira e — quem sabe — mundial: o deputado-presidiário.
Pelo jeito, a revista não se preocupou em pesquisar muito. Para Elio Gaspari, na Folha de São Paulo de hoje, “há precedentes de diversos países e nos Estados Unidos chegou-se a situações ainda mais esquisitas. Dois deputados foram reeleitos enquanto estavam na cadeia. Um deles, depois de solto, assumiu a cadeira e deu o voto que garantiu a presidência a Thomas Jefferson. Um terceiro, Jay Kim, condenado a um ano de prisão domiciliar em 1988, ia ao Congresso com uma pulseira eletrônica, sabendo que sua rotina seria de lá para casa”.
Quer dizer, se nos Estados Unidos já houve deputado-presidiário, então a pátria está salva.
Joaquim Barbosa, o catão tupiniquim, considerou “incongruência constitucional” e "impasse constitucional absurdo" a decisão da Câmara dos Deputados de manter o mandato do colega presidiário. Ora, Barbosa preside a corte que aplainou caminho para a manutenção do mandato, ao delegar ao Congresso esta tarefa, há três semanas. Se delegou, é claro que admitia a hipótese desta votação.
"Quando nós julgamos, no ano passado e neste ano, eu disse claramente que seria uma incongruência muito grande manter no Congresso um parlamentar condenado e, mas o Congresso Nacional é soberano – disse o ministro - . Tomou a decisão e terá que lidar com as consequências desse ato a cumprir pena. Lamento muito que estejamos hoje diante desse impasse constitucional absurdo", afirmou.
Na verdade, está passando a bola à frente. Quem abriu as portas – e teria de lidar com as consequências do ato foi o STF. Longe de mim defender um deputado corrupto. Aliás, não defendo nem deputado honesto. Mas sempre é conveniente bancar o advogado do diabo. Que há de errado na figura do deputado-presidiário? Como vimos – e como o STF autorizou – ilegal não é. É anti-ético? Que seja. Ética não tem força de lei. A propósito, que preconceito é esse de falar em presidiário? O ministro Marco Aurélio Mello é mais adequado a estes tempos politicamente corretos: "Os reeducandos da Papuda estão homenageados com a presença de um deputado federal”.
Reeducando-deputado, portanto. Soa melhor e fere menos a dignidade do Congresso. É mais uma jabuticaba da política nacional? Pelo visto não é. O que é bom para os Estados sempre foi bom para o Brasil.
Diz nosso código no artigo primeiro da Lei de Execução Penal:
“Art 1º- Execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado.”
Em artigo assinado por uma plêiade de juristas (Manoel Valente Figueiredo Neto, Yasnaya Polyanna Victor Oliveira de Mesquita, Renan Pinto Teixeira, Lúcia Cristina dos Santos Rosa), no site ambito-juridico.com.br, leio:
De acordo com o artigo supramencionado percebe-se a dupla finalidade da execução penal qual seja, dar sentido e efetivação do que foi decidido criminalmente além de dar ao apenado condições efetivas para que ele consiga aderir novamente ao seio social e assim não cair nas antigas malhas do crime.
A reinserção social tem como objetivo a humanização da passagem do detento na instituição carcerária, procura dar uma orientação humanista colocando a pessoa que delinqüiu como centro da reflexão cientifica.
Empunhando a Declaração Universal dos Direitos do Homem em seu artigo 1º - “Todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade” - os autores afirmam:
De acordo com o vemos em tal declaração é importante destacar que o apenado cometeu um erro, deve arcar com suas conseqüências, mas não pode ser esquecido que enquanto ser humano, deve ser tratado com humanidade e com condições para que voltando à sociedade não volte a vida que tinha, a vida de criminalidade.
O Prof. Zacarias (2006, p. 61) ressalta que:
“O trabalho é importante na conquista de valores morais e materiais, a instalação de cursos profissionalizantes possibilita a resolução de dois problemas, um cultural e outro profissional. Muda o cenário de que a grande maioria dos presos não possui formação e acabam por enveredar, por falta de opção, na criminalidade e facilitam a sua inserção no mercado de trabalho, uma vez cumprida a pena.”
Ora, o deputado Donadon apenas cometeu um erro – ou um malfeito, como diria a presidente – e não pode ser esquecido enquanto ser humano. Deve ser tratado com humanidade e com condições para que voltando à sociedade não volte a vida que tinha, a vida de criminalidade. É claro que o reeducando Donadon, após os dois meses em que comeu mal na Papuda, jamais voltaria à vida que tinha.
Mantendo seu mandato, jamais acabaria por enveredar, por falta de opção, na criminalidade e sua inserção no mercado de trabalho seria dispensável, já que não perdeu seu emprego.
Deputado-presidiário – perdão, deputado-reeducando – ainda não vi no Brasil. Mas já vi funcionário público preso e batendo ponto. Nos anos 80, em Porto Alegre, houve o caso sui generis de um fiscal da Receita Federal condenado e preso por corrupção. Como o Direito Administrativo é ainda mais lento que o Penal, mesmo condenado não havia sido demitido do serviço público. Todos os dias, sob escolta, era levado à sua repartição para continuar exercendo suas funções.
Fora do serviço público, na mesma Porto Alegre, tivemos o caso do jornalista Flávio Alcaraz Gomes. Condenado por ter detonado a calota craniana de uma universitária, foi demitido de sua empresa, a Caldas Júnior, e acolhido pela RBS. Ao ser condenado, continuou trabalhando como repórter em sua cela. Teve inclusive a oportunidade de colocar no ar uma sessão de tortura.
Confesso nada ver de insólito na figura de um deputado que de dia brande o verbo na Câmara e à noite volta para trás das grades. Ilegal não é. Inédito, tampouco. Está ganhando muito? Fez por merecer: concorreu ao cargo e foi eleito. Se alguma culpa existe, está no voto de seus eleitores. Que também guindaram à deputação Zé Dirceu, José Genoíno, João Paulo Cunha e demais mensaleiros. E se o eleitor quer, que fazer?
Afinal, vivemos numa democracia.
01 de setembro de 2013
janer cristaldo
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