"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sábado, 24 de agosto de 2013

APRENDIZADO COM JOAQUIM

 
 


Ao tempo em que toca adiante a fase final e definitiva, que deverá desaguar no cumprimento das sentenças dos réus, condenados no julgamento do processo do Mensalão – com afinco, rigor necessário e sem titubeios ou meias palavras no trabalho a cumprir, “porque o país e a sociedade têm pressa” – o ministro presidente do STF, Joaquim Barbosa, continua a demonstrar sua enorme e inesgotável capacidade de surpreender.

Nas últimas duas semanas, retomadas as atividades na Suprema Corte do Brasil, em ambiente minado por velhos truques de astúcias judiciais protelatórias, além de novas armadilhas, o ministro Joaquim segue aparentemente inabalável em sua missão de magistrado. E vai além, na invejável conduta política e pessoal, como demonstrado nos mais recentes e duros embates.

Joaquim Barbosa tem suprido com sobras, dentro e fora do Tribunal que ele comanda (com alcance muito além das fronteiras nacionais) duas das carências mais sentidas do Brasil destes tempos temerários que atravessamos: a de firmeza nas atitudes e a de exemplos significativos dos homens públicos.

Com o andar da locomotiva reposto aos trilhos, depois dos trancos e abalos dos últimos dias, estou cada dia mais convencido do relevante papel do presidente do STF no aclaramento de questões essenciais da Justiça e do Jornalismo. Principalmente no enfrentamento das desconfianças e medos recíprocos de um lado e do outro.

Na historicamente complexa e intrincada relação com juízes, nas coberturas jornalísticas de processos judiciais (comecei minha carreira de repórter cobrindo o Fórum Rui Barbosa para o jornal A Tarde, na Bahia), um dos principais ensinamentos do caso Mensalão se dá exatamente nesse ponto. Isso, sem dúvida, a partir do jeito próprio e especial de ser e de atuar do presidente Joaquim.

O julgamento que corre no Supremo, despido dos salamaleques entre pares (jornalistas também), que o ministro Barbosa abomina e não suporta declaradamente, exibe, com todas as nuances e contrastes, uma realidade que durante décadas e décadas se manteve intocada. Nos julgamentos nos fóruns e nas coberturas da imprensa, para regozijo e gozo intelectual das duas partes, em suas respectivas feiras de vaidades.

O presidente do STF mostra com palavras e ações práticas, no seu trabalho no comando (repita-se) do processo Mensalão, aquilo que o experiente jornalista argentino Claudio Andrada, do Clarin, já havia apontado em 1993, no lúcido depoimento no livro “Entre Periodistas”, editado por Teódulo Dominguez.

Um guia de como pensar e fazer jornalismo que não canso de ler, reler e citar, pois a cada dia parece mais atual e verdadeiro em cada uma de suas 228 páginas e mais de uma dezena de entrevistas-depoimentos. Tudo com estilo e arte de quem sabe fazer perguntas e de quem sabe dar boas respostas.

Ali está dito que justiça tem duas partes: a da justiça em si e, logo, a da política: “A política está presente em todas as resoluções tomadas pela justiça, em qualquer nível, seja um juiz da primeira instância ou um juiz da Corte Suprema”, assinala Andrada.

Isso fica muito mais evidente na Corte Suprema. Aí fica delineado o rol político jogado pelo juiz. Política, porque ao ter como função o controle das leis, a aplicação da lei e sua implementação, além do zelo essencial pelo cumprimento da Constituição, o magistrado está cumprindo uma função eminentemente política.

“Além disso, porque às vezes deve sentenciar sobre assuntos que tem fundo político e que não é de maneira alguma uma simples questão judicial”, resume Claudio Andrada em “Entre Periodistas”.

E acerta na mosca, na Argentina ou no Brasil.

O resto é a velha desconfiança e medo recíprocos decorrentes da relação de juízes e jornalistas, não apenas nos seus respectivos e específicos campos do conhecimento, técnicas e práticas profissionais, mas também no campo pessoal.

A sociedade brasileira, com o julgamento do Mensalão, parece entender cada dia melhor esta realidade, à medida que o processo se aproxima do desfecho.

Até lá, vale prestar sempre mais atenção nos ensinamentos que saem da Corte comandada pelo ministro Joaquim, neste julgamento histórico e sem precedentes. Vale para magistrados e jornalistas.

24 de agosto de 2013
Vitor Hugo Soares é jornalista, editor do site blog Bahia em Pauta.

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