"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

terça-feira, 1 de outubro de 2019

A ALTA DO DÓLAR PODERÁ CONTER A QUEDA DOS JUROS

Diante da possibilidade de acontecer mais cortes na taxa básica da economia (Selic) e com a moeda norte-americana há mais de um mês se valorizando, toda vez que ela sobe com consistência, certa apreensão desponta logo no mercado financeiro. Atualmente, o temor não é só pela alta da moeda e o que ela venha a representar; acontece que, no limite, uma desvalorização muito acentuada do real pode despertar pressões inflacionárias e ameaçar o processo de queda da Selic.

A ata do Copom (Comitê de Política Monetária), divulgada pelo BC (Banco Central), confirma o que já estava claro no comunicado da última reunião do colegiado: o juro básico deve manter a sua trajetória de queda e fechar 2019 em 5% ao ano como consequência da consolidação do cenário benigno da inflação. A alta dos preços provavelmente permanecerá abaixo da meta, mesmo que os juros caiam ainda mais e o dólar se estabilize por volta de R$ 4,05. Seguramente, esta deverá ser a menor taxa básica de juros desde a estabilização econômica em 1994, aproximando-se da realidade de vários países que andam em torno de zero, nesses tempos de economia estagnada.

Ao reduzir os juros, o BC diminui a perspectiva de uma recessão e pode estar adentrando em ambiente iminentemente expansionista. Desde a implantação do Plano Real, esta é a primeira vez que o BC tem a oportunidade de fazer política monetária anticíclica.

Entretanto, não é descartada a hipótese de que o ciclo de afrouxamento monetário possa ser interrompido se continuar persistindo a alta do dólar e a inflação venha a acelerar. Até que o juro poderá vir a cair abaixo de 5% a.a. se o câmbio colaborar, todavia, acima de R$ 4,40, ele se torna um perigoso entrave para alguns economistas. Neste caso, tem que se observar principalmente a rapidez do movimento e como se comportam os outros emergentes.

O real acumula uma queda em torno de 8,5% desde o final de julho até esta data, bem acima das 24 moedas de mercados emergentes, com exceção do peso argentino, completamente abalado com a moratória do país, em clima de ‘déja vu’ e que dificilmente conseguirá escapar de outro calote. Além disso, haverá uma forte ameaça, a partir de outubro, se a Argentina novamente vier a ter um governo de esquerda. Poderão retornar a corrupção e as políticas populistas e, sobretudo, o protecionismo comercial na contramão da recente modernização do Mercosul.

O dólar, no final de agosto, atingiu rapidamente o patamar de R$ 4,20, porém desacelerou logo em seguida e o BC naquele momento não apostou na sua escalada, surpreendendo o mercado com várias intervenções cambiais no decorrer do período de negociação. Depois de 10 anos, o BC vem fazendo intervenções no câmbio à vista, vendendo reservas internacionais para controlar as distorções do mercado causadas pela fuga de capitais. Já venderam cerca de US$ 1,3 bilhão, o que não representa muito perto dos US$ 386 bilhões que ainda temos disponíveis.

A autoridade monetária (BC) e analistas econômicos continuam prevendo a inflação anual abaixo da meta para 2020, mesmo com o avanço do dólar. O IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), nos últimos 12 meses encerrados em agosto, apresentou alta de 3,44%, enquanto, segundo a pesquisa Focus divulgada na última segunda-feira, o mercado financeiro projeta inflação de 3,8% no final de 2020, abaixo da meta de 4% para o exercício. Até então, não existem pressões inflacionárias no horizonte e a economia sinaliza uma trajetória de crescimento relativamente fraco, ainda que com leve aceleração.

Uma desvalorização cambial mais intensa, fruto do pessimismo da crise comercial entre EUA e China, do processo de saída do Reino Unido da União Europeia, da turbulência econômica na Argentina e, para completar, do pedido de impeachment de Donald Trump, podem sacudir os mercados nos próximos meses. Estes me parecem ser os motivos mais influentes para cercear a liberdade da nossa política monetária.

É difícil imaginar que o Banco Central vá ficar queimando reservas para segurar o dólar, justamente quando ele mesmo admite que o movimento se dá em função do cenário internacional. Isso, realmente, traz o risco de ajuste de uma Selic menor.

01 de outubro de 2019
Arthur Jorge Costa Pinto é Administrador, com MBA em Finanças pela UNIFACS (Universidade Salvador).

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