O documentário do Brasil Paralelo intitulado ‘’1964: O Brasil entre armas e livros’’ vem causando o maior rebuliço entre as classes falantes e intelectuais.
Não é para menos. Buscando contar os acontecimentos que levaram à contrarrevolução de 1964 e ao regime militar, a série elucida mitos e destrói uma narrativa mentirosa e desgastada.
Leitores da minha coluna na RENOVA Mídia vão lembrar que já tratei do mesmo tema em outro artigo. Nele fiz um curtíssimo resumo sobre detalhes antecessores a 1964. Preciso agora colocar outros para complementar o que disse e fazer o papel proposto por mim em minha coluna: dar uma luz nessa escuridão chamada mídia brasileira – a qual muitos brasileiros ainda tem como norte para alguma coisa.
Lembro novamente o período tratado: Guerra Fria, subida de Kruschev ao Kremlin, política de longo alcance adotada pelo bloco soviético. A URSS confiava nas mudanças realizadas no fim da década de 1950 para vencer o conflito ideológico com os Estados Unidos sem disparar uma bala. A ideia era obter concessões militares, econômicas, tecnológicas e políticas do Ocidente capitalista liderado pelos EUA para isolá-lo. Com as mudanças internas conferido mais poder ao regime, a via externa seria melhor explorada para que os objetivos da política de longo alcance fossem alcançados.
Quais os meios foram utilizados para a política de longo alcance ser colocada em prática? Muito simples: os serviços de inteligência do bloco soviético. A mentira e o engodo são estratégias fundamentais para a vitória em uma guerra, e o bloco comunista entendeu isso como ninguém. Os objetivos eram realizar operações de desinformação para confundir o inimigo, obter informações estratégicas para o bloco e jogar as populações locais dos países alvos contra seus governantes – caso mais notório o da Operação Áries, que explorou a Guerra do Vietnã para florescer o antiamericanismo nos EUA.
O processo é muito bem descrito em dois livros: ‘’Desinformação’’, do tenente-general Ion MIhai Pacepa, e ‘’Meias verdades, velhas mentiras’’, do desertor soviético Anatoliy Golitsyn.
O Brasil, maior país da América Latina e um dos mais desenvolvidos do Terceiro Mundo, sempre foi cobiçado pelo bloco soviético. Sua localização era estratégica, e visto que o antiamericanismo era forte entre as classes políticas, um trabalho bem feito de espionagem e infiltração possibilitariam um golpe para a instauração de um regime comunista no país.
Importante lembrar que a União Soviética não agia diretamente em operações de desinformação e infiltração no Terceiro Mundo. Esse papel era delegado aos serviços secretos de países satélites comunistas.
No caso brasileiro, o que aqui agiu foi a StB, serviço de inteligência da Tchecoslováquia. Os objetivos eram muitos claros e estavam em conformidade com os ditames da política de longo alcance: enviar agentes e espiões para o Brasil, infiltrar-se no governo brasileiro, nas embaixadas, no serviço de inteligência brasileiro, no parlamento e na mídia, a fim de conseguir informações valiosas sobre o país para repassá-las aos ‘’amigos’’ – nome dado aos soviéticos e sua KGB.
As informações sobre a atividade da StB no Brasil estão bem descritas no livro ‘’1964: O Elo Perdido – O Brasil nos arquivos do serviço secreto comunista’’, escrito pelos jornalistas e pesquisadores Mauro Abranches Kraenski e Vladimir Petrilák. Irei discorrer brevemente sobre tais atividades e duas operações ativas que aconteceram no Brasil.
Uma delas atende-se pelo nome de ‘’STROJ’’, palavra que em português significa ‘’máquina’’. Através de contatos, colaboradores ativos e agentes, a StB conseguiu executar sua política de influência em um jornal chamado ‘’O Semanário’’, que tinha uma linha editorial antiamericana e nacionalista. O mesmo tinha uma grande notabilidade não só com leitores, mas também entre políticos da frente nacionalista.
Outra que merece destaque é a operação ativa ‘’LUTA’’. O objetivo da operação está descrito em um documento da StB, o qual era muito simples pelo nome altamente sugestivo: causar uma guerra civil no Brasil. O modus operandi era utilizar-se de políticos e militares nacionalistas, além do movimento das ligas camponesas chefiadas pelo deputado pernambucano Francisco Julião.
Outros feitos importantes foram realizados: a proximidade do agente da KGB, Alexandr Alexeyev, com o então presidente do Brasil, Jânio Quadros. O agente soube de antemão que Jânio reataria relações diplomáticas com a URSS – o que de fato aconteceu. Como soube? Ouviu do próprio presidente.
O livro também revela que a participação americana nos acontecimentos de 1964 não passa de uma farsa criada pelo bloco soviético. Quando o presidente João Goulart foi deposto pelo Congresso, um documento ultrassecreto foi produzido pela rezidentura da StB no Brasil direcionado à elite do partido comunista tcheco. Em momento algum do documento é citada alguma ajuda americana às forças civis brasileiras que lideraram o movimento para tirar Jango do poder. O presidente americano Lyndon Johnson enviou uma frota naval para proteger os americanos em caso de guerra civil, papel que lhe era obrigatório, caso contrário poderia até mesmo sofrer impeachment. E a mesma só chegaria ao Brasil no dia 11 de abril – muito depois da contrarrevolução.
Somos ainda um país construído por narrativas e mitos mentirosos. A urgência de jogar tomates na historiografia oficial e fazer um mutirão pela verdade é uma obrigação moral para com as gerações passadas e as vindouras. É justamente isso que a série do Brasil Paralelo faz. É disso que precisamos.
04 de abril de 2019
Carlos Junior
renova mídia
Não é para menos. Buscando contar os acontecimentos que levaram à contrarrevolução de 1964 e ao regime militar, a série elucida mitos e destrói uma narrativa mentirosa e desgastada.
Leitores da minha coluna na RENOVA Mídia vão lembrar que já tratei do mesmo tema em outro artigo. Nele fiz um curtíssimo resumo sobre detalhes antecessores a 1964. Preciso agora colocar outros para complementar o que disse e fazer o papel proposto por mim em minha coluna: dar uma luz nessa escuridão chamada mídia brasileira – a qual muitos brasileiros ainda tem como norte para alguma coisa.
Lembro novamente o período tratado: Guerra Fria, subida de Kruschev ao Kremlin, política de longo alcance adotada pelo bloco soviético. A URSS confiava nas mudanças realizadas no fim da década de 1950 para vencer o conflito ideológico com os Estados Unidos sem disparar uma bala. A ideia era obter concessões militares, econômicas, tecnológicas e políticas do Ocidente capitalista liderado pelos EUA para isolá-lo. Com as mudanças internas conferido mais poder ao regime, a via externa seria melhor explorada para que os objetivos da política de longo alcance fossem alcançados.
Quais os meios foram utilizados para a política de longo alcance ser colocada em prática? Muito simples: os serviços de inteligência do bloco soviético. A mentira e o engodo são estratégias fundamentais para a vitória em uma guerra, e o bloco comunista entendeu isso como ninguém. Os objetivos eram realizar operações de desinformação para confundir o inimigo, obter informações estratégicas para o bloco e jogar as populações locais dos países alvos contra seus governantes – caso mais notório o da Operação Áries, que explorou a Guerra do Vietnã para florescer o antiamericanismo nos EUA.
O processo é muito bem descrito em dois livros: ‘’Desinformação’’, do tenente-general Ion MIhai Pacepa, e ‘’Meias verdades, velhas mentiras’’, do desertor soviético Anatoliy Golitsyn.
O Brasil, maior país da América Latina e um dos mais desenvolvidos do Terceiro Mundo, sempre foi cobiçado pelo bloco soviético. Sua localização era estratégica, e visto que o antiamericanismo era forte entre as classes políticas, um trabalho bem feito de espionagem e infiltração possibilitariam um golpe para a instauração de um regime comunista no país.
Importante lembrar que a União Soviética não agia diretamente em operações de desinformação e infiltração no Terceiro Mundo. Esse papel era delegado aos serviços secretos de países satélites comunistas.
No caso brasileiro, o que aqui agiu foi a StB, serviço de inteligência da Tchecoslováquia. Os objetivos eram muitos claros e estavam em conformidade com os ditames da política de longo alcance: enviar agentes e espiões para o Brasil, infiltrar-se no governo brasileiro, nas embaixadas, no serviço de inteligência brasileiro, no parlamento e na mídia, a fim de conseguir informações valiosas sobre o país para repassá-las aos ‘’amigos’’ – nome dado aos soviéticos e sua KGB.
As informações sobre a atividade da StB no Brasil estão bem descritas no livro ‘’1964: O Elo Perdido – O Brasil nos arquivos do serviço secreto comunista’’, escrito pelos jornalistas e pesquisadores Mauro Abranches Kraenski e Vladimir Petrilák. Irei discorrer brevemente sobre tais atividades e duas operações ativas que aconteceram no Brasil.
Uma delas atende-se pelo nome de ‘’STROJ’’, palavra que em português significa ‘’máquina’’. Através de contatos, colaboradores ativos e agentes, a StB conseguiu executar sua política de influência em um jornal chamado ‘’O Semanário’’, que tinha uma linha editorial antiamericana e nacionalista. O mesmo tinha uma grande notabilidade não só com leitores, mas também entre políticos da frente nacionalista.
Outra que merece destaque é a operação ativa ‘’LUTA’’. O objetivo da operação está descrito em um documento da StB, o qual era muito simples pelo nome altamente sugestivo: causar uma guerra civil no Brasil. O modus operandi era utilizar-se de políticos e militares nacionalistas, além do movimento das ligas camponesas chefiadas pelo deputado pernambucano Francisco Julião.
Outros feitos importantes foram realizados: a proximidade do agente da KGB, Alexandr Alexeyev, com o então presidente do Brasil, Jânio Quadros. O agente soube de antemão que Jânio reataria relações diplomáticas com a URSS – o que de fato aconteceu. Como soube? Ouviu do próprio presidente.
O livro também revela que a participação americana nos acontecimentos de 1964 não passa de uma farsa criada pelo bloco soviético. Quando o presidente João Goulart foi deposto pelo Congresso, um documento ultrassecreto foi produzido pela rezidentura da StB no Brasil direcionado à elite do partido comunista tcheco. Em momento algum do documento é citada alguma ajuda americana às forças civis brasileiras que lideraram o movimento para tirar Jango do poder. O presidente americano Lyndon Johnson enviou uma frota naval para proteger os americanos em caso de guerra civil, papel que lhe era obrigatório, caso contrário poderia até mesmo sofrer impeachment. E a mesma só chegaria ao Brasil no dia 11 de abril – muito depois da contrarrevolução.
Somos ainda um país construído por narrativas e mitos mentirosos. A urgência de jogar tomates na historiografia oficial e fazer um mutirão pela verdade é uma obrigação moral para com as gerações passadas e as vindouras. É justamente isso que a série do Brasil Paralelo faz. É disso que precisamos.
04 de abril de 2019
Carlos Junior
renova mídia
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