"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

UMA INCONSEQUENTE HERANÇA FISCAL

Com muitas dificuldades vencemos mais um ano, embora não tenha sido cumprida uma das promessas de Temer ao assumir os destinos da Nação, em maio de 2016. Comprometeu-se, naquele instante, em não aumentar os tributos que oneram a sociedade brasileira.

Mas, em julho do ano passado, percebendo o início da queda acelerada da inflação, imediatamente, antecipou-se, surpreendendo a todos com o aumento na tributação da gasolina, diesel e etanol enquanto ainda atravessávamos momentos dificílimos, tentando sair de uma profunda, longa e nefasta recessão, porventura uma das maiores já registradas em nossa história econômica.

Inclusive a arrecadação de impostos não dava o menor sinal de reação e as insatisfações amedrontavam a burocracia federal em função de um evidente risco de não cumprimento da meta fiscal estabelecida. As receitas extraordinárias oriundas da venda de ativos igualmente sinalizavam dificuldades para se concretizarem.

Por meio de um decreto, o governo aumentou o PIS/Cofins dos combustíveis e em seguida solicitou ao Congresso a aprovação de uma meta fiscal mais generosa para as contas do governo federal. Os congressistas atenderam imediatamente a solicitação e o déficit previsto de R$ 139 bilhões elevou-se para R$ 159 bilhões.

Os ministérios padeciam diante da carência de recursos para custear a máquina pública e os serviços prestados à comunidade foram completamente afetados. Lembro-me de que chegaram a tal ponto, que faltou dinheiro até para a emissão de passaportes. Vergonhoso!

O governo encerrou 2017 com ótimas perspectivas ao apresentar um déficit fiscal nas contas do setor público entre R$ 20 a R$ 30 bilhões, o que o deixará abaixo da meta; há também o começo da recuperação na arrecadação da Receita Federal e o ingresso de receitas extras num nível acima do esperado. Com isso, as despesas foram logo desbloqueadas e mais recursos de emendas parlamentares foram liberados a fim de atender às “vultosas” articulações que foram realizadas nos últimos meses a fim de resolver interesses exclusivamente governamentais.

O ano de 2017 foi também marcado pelo perdão de dívidas, deixando-nos a impressão de que as coisas estavam melhorando na esfera fiscal diante de inúmeros “mimos” natalinos bem distribuídos pelo então presidente da República.

Se não me engano, o último deles foi feito antes de se iniciar o recesso do final de ano, com a edição de uma Medida Provisória que permite um auxílio direcionado aos municípios no total de R$ 2 bilhões - um verdadeiro compromisso de “campanha” pela aprovação da reforma da Previdência que deverá ter um impacto razoável no Orçamento de 2018.

É necessário lembrar que esses “auxílios” enviados aos prefeitos, no limiar de um ano eleitoral, são todos classificados como despesa no Orçamento federal e deverão ser compensados com o corte de outros gastos, assim como terão que ser retirados de alguma conta da proposta orçamentária deste exercício.

O atual mandatário da Nação, inspirando-se na sua “iluminada” antecessora, promove um alucinante populismo fiscal com os recursos públicos. Parece-me existir uma pressão contínua que vem de cima sobre a equipe econômica e o desânimo que domina os técnicos tornou-se intensamente visível.

Recordo-me da última entrevista concedida pelo reconhecido economista Gustavo Franco dias atrás a um grande veículo de comunicação nacional (uma verdadeira alusão ao que destaco acima): “Em seu formato mais inofensivo o populismo é uma torrente de bondades que sabiamente provoca inflação e recessão”. A variante mais perigosa, no entanto, é a que apela ao confronto e identifica vilões.

Sinto-me num cenário bastante semelhante ao que aconteceu em 2014, quando uma grande quantidade de medidas irresponsáveis de afrouxamento fiscal foi deliberada à medida que as eleições se aproximavam. O pior é que o Planalto continua apresentando indícios de que mais concessões serão efetivadas ao longo de 2018 e os governadores, pelo visto, seguem as mesmas tendências.

Como vemos, portanto, a conduta governista sobre a questão fiscal é completamente enganosa. A redução do déficit fiscal previsto para 2017 não vai mudar o quadro de fragilidade das contas públicas, que deverá continuar piorando e ninguém sabe quando isso será revertido. Lamentavelmente, a trajetória da dívida do setor público é ascendente. Atualmente a previsão do Banco Central é de que ela vai subir dos atuais 74,4% (novembro de 2017) para 79,8% do PIB (Produto Interno Bruto) ao final deste exercício.

Provavelmente deverá se repetir o que aconteceu com Dilma em um ano de eleição presidencial - assistir o Brasil ser novamente rebaixado pelas agências de classificação de risco. Mesmo assim, Temer segue embalado, pavimentando com suas próprias mãos a descida de uma ladeira, cujo destino final será uma provável insolvência das contas públicas, o que, inevitavelmente, terá que ser assumida pelo seu sucessor, apesar dos seus discursos serem amplamente reformistas.

Embora os brasileiros já estejam navegando impulsionados pelos bons ventos da retomada da economia, que deverá ser lenta e gradual, nem por isso deixarão de enfrentar as águas turbulentas como consequência do processo eleitoral, o que irá tirar dos seus olhos um pouco de visibilidade diante de um horizonte cheio de incertezas devido à inconsequente deterioração das contas públicas.

08 de janeiro de 2018

Arthur Jorge Costa Pinto é Administrador, com MBA em Finanças pela UNIFACS (Universidade Salvador)

Nenhum comentário:

Postar um comentário