Vingado “o golpe”, estropiado o PSDB, tarde demais para o Brasil, o dr. Janot se anuncia disposto a conceder que existe sim diferença entre “caixa 2” para financiamento de campanhas e o comércio de leis e de acesso aos cofres do BNDES e das “brases” para cumplices no crime publicos e privados se locupletarem, seja de dinheiro, seja de poder ilimitado pela compra da desmoralização da política.
Estes que, ainda que descuidando de examinar a origem, tomaram contribuições privadas apenas para financiar campanhas por mandatos com início e fim – como tomaram todos quantos disputaram eleições nestes 32 anos – eram maioria no Congresso Nacional conforme estava prestes a ficar provado com a aprovação das duas reformas mandadas por Temer. Uma arranharia de leve o desfrute ilegal-legalizado dos dinheiros públicos pelo “marajalato” de que a corporação do Judiciário ocupa o topo. A outra tiraria de cena, junto com o trabalhismo de achaque, o imposto sindical com que, já lá vão 74 anos, Getulio Vargas garantiu que no Brasil, em se plantando democracia representativa, não dá.
Tudo foi providencialmente abortado na véspera de acontecer, mais que pela delação, que sozinha não tem força para tanto, pelas emocionantes “ações controladas” com que o dr. Janot sentiu a necessidade de ilustra-las, urdidas para o sócio do BNDES de Lula executar e para Luiz Edson Fachin, aquele juiz que discursava cheio de paixão nos comícios eleitorais de Dilma Rousseff, homologar em tempo recorde.
O reconhecimento dessa diferença a tempo poderia ter proporcionado a virada do cabo das tormentas a que estamos agarrados ha tres anos por dentro da política. Era o que antecipava uma população tão carente de qualquer gesto a seu favor que fez a economia real reagir antes de qualquer mudança concreta apenas por ter ao longo de um ano no primeiro posto da Republica alguém que falava de Brasil e não apenas de si mesmo. Mas o alinhamento que se ensaiava da política com remédio contra a política sem remédio a favor do Brasil não interessava, nem à "privilegiatura", nem a quem sairia do episódio como o grande derrotado da conspiração mapeada desde o mensalão para “corromper a política” – e não só políticos – e impor ao país uma “hegemonia” bolivariana.
O efeito final que não se conseguiu com dinheiro acabou sendo produzido por essa cegueira temporária da justiça. Com todos os políticos amarrados no mesmo saco e ameaçados de afogamento iminente, Brasília se apropriou da marca de Curitiba e, rápida como um raio, reescreveu a “narrativa” da operação Lava Jato: o maior instrumento da conspiração para destruir a política com dinheiro, valendo quatro Odebrechts em numero de almas arrecadadas para o diabo, é reapresentado à platéia como o herói arrependido da luta contra a corrupção “dos brasileiros”; Michel Temer e Aécio Neves, o pedinchador de merrecas, passam de coadjuvantes a “chefes da quadrilha mais perigosa do Brasil”, e Lula, coitado, é transposto para os bastidores como um incauto abusado pelos ministros em quem ingenuamente confiou enquanto o solerte Renan, que sempre sabe onde é que a lepra vai recidir, dava no Senado a primeira punhalada na reforma trabalhista.
Ha muito, já, que o crime aprendeu a instrumentalizar a imprensa. Planta indignação para colher arbítrio com a mesma fria premeditação do terrorista que semeia pânico para colher ditaduras. Mas os jornalistas recusam-se olimpicamente a levar em conta esse dado da realidade. Graças a isso, ao dolo que sempre rondou a operação desse poder coadjuvante (o “4º”) das republicas porque poder ele é, também a leviandade do dono, a vaidade do reporter, a pusilanimidade do chefe e até a competitividade das empresas passaram a pesar sem peias na equação que transformou a arma antes mais temida na arma hoje mais acionada pelos inimigos da democracia no Brasil.
Vão pelo mesmo caminho os nossos Ministério Público e Poder Judiciário televisivos. Se estavam “funcionando as instituições” como se consolavam os brasileiros em dizer mais perto do espigão, isto já não é tão claro a esta altura da nossa ladeira abaixo pois nem na nossa vasta constituição está escrito qualquer coisa que autorize essa Lava Jato made in Brasilia, a elevar “pegadinhas” à condição de prova, homologar gravações sem gravadores, dar aos grandes a indulgência plenária negada aos pequenos ou “destituir” com um murmúrio de um indivíduo solitário 56 milhões de eleitores (ainda que traídos) sem processo nenhum.
Das 1829 almas angariadas pelos perdoados ésleys, o dr. Janot e o dr. Fachin monocraticamente contentaram-se só com duas. E para tras até da Fifa, seus colegas do STF, onde todos os votos querem continuar para todo o sempre “magníficos”, recusam a contraprova da realidade: se está contra a lei e está contra os fatos, danem-se a lei e danem-se os fatos. Mas não demorou muito e já temos mais um flagrante de contato de mucosas sem proteção entre acusados e acusadores desta delação a entortar a retidão da indignação pública tão cuidadosamente semeada. La estavam Lula, Joésley, Temer, Eduardo Cunha e sabe-se lá mais o que juntos uns nas casas dos outros, a nos dizer de novo o que já estamos cansados de saber: que não ha santos, ha apenas dossies ainda inéditos.
O pano de fundo que todos cuidam juntos de omitir, imprensa à frente, é o que imediatamente desconfunde toda essa aparente confusão: o quão estupenda é a passagem do marajá por este vale de lágrimas e doce é a vida sem crise do nomeado ou do concurseiro que consegue saltar da nau dos que sustentam para a nau dos que são sustentados!
Tem um Brasil que precisa de reformas para sobreviver e tem um Brasil que não sobreviverá a reformas. Um onde o salário só sobe e outro onde salário não há. Um que tem todos os direitos adquiríveis e outro que não tem direito nenhum.
É isso, sem emoções, que precisa acabar.
Não é pelo passado, em que se lambuzaram todos com todos, que Temer está sendo fuzilado. É pelo que propos para o futuro, o maldito vira-casaca!
26 de dezembro de 2017
Vespeiro, Estado de S.Paulo
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