"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

CÁRMEN LÚCIA DEVIA TER DECLARADO INCONSTITUCIONAL O 'GENEROSO' INDULTO DE TEMER

Em consideração e atendimento aos comentaristas Marcelo Mafra e Silvio Amorim, devo esclarecer que o Poder Judiciário (leia-se, magistratura) não pode agir e intervir sem ter sido provocado através do meio próprio que é a impetração (propositura) de uma ação, sejam quais forem o tema e o assunto, seja qual for a ação proposta.
Mas uma vez provocado, o princípio segundo o qual o magistrado fica adstrito ao que lhe foi pedido, não podendo decidir além do pedido (ultra petita) e fora do pedido (extra petita) é abrandado. Mas que isso, fica superado e deixa de existir, mormente quanto se trata de direito indisponível, de Direito Público, de Direito das Gentes por dizerem respeito aos interesses nacionais e coletivos.
UMA LEI MAIOR – A Lei de Introdução Às Normas do Direito Brasileiro (Lei nº 12.376, de 30.12.2010) indica como o magistrado deve aplicar a lei, seja esta infraconstitucional ou constitucional, uma vez que a referida lei não faz distinção entre a Lei Maior e as Leis Menores. Alcança e abrange, portanto, todas as legislações, inclusive a Carta da República.
Diz lá no artigo 5º que “Na aplicação da lei o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum”.
Indaga-se: neste decreto de indulto qual o fim social e o bem comum que dele se pode extrair quando não deixou de fora os crimes de lesa-pátria, que são aqueles que agentes públicos e particulares cometeram contra os dinheiros do povo brasileiro?. O decreto do indulto abrangeu a corrupção e a lavagem de dinheiro porque, no entender de Temer e sua equipe, foram crimes cometidos sem violência ou grave ameaça.
VIOLÊNCIA INTRÍNSECA – Perdão, mas a violência nesses crimes está intrínseca. É plasmada. É evidente. Dispensa comprovação. Violência concretizada e não apenas mera ameaça. Violência silenciosa, dos que vestem terno e gravata, ocupam palácios e gabinetes e têm como arma a caneta e o poder, como consta no artigo comentado e que trouxeram danos de toda a ordem a multidões e multidões de brasileiros.
Se tecnicamente não é considerado crime hediondo (e este foi excluído do decreto do indulto), é crime muito mais grave porque constitui crime de traição à Pátria, ao povo brasileiro. Creio que até esteja sujeito à Lei de Segurança Nacional.
Daí porque corruptos e corruptores não podem ser beneficiados com este decreto esdrúxulo e casuístico que Temer baixou neste Natal-2017. Todo ele está contaminado de inconstitucionalidade. E quando o magistrado está diante de inconstitucionalidade(s), ele não necessita ser provocado para declará-la(s). Deve pronunciá-las de ofício, ainda que a petição que lhe foi entregue para exame e decisão nada peça a tal respeito.
DECLARAÇÃO INCIDENTAL – Neste caso, não haverá julgamento nem extra nem ultra petita. É a chamada declaração incidental de inconstitucionalidade. Uma vez declarada, nos juízos singulares e tribunais estaduais, a declaração tem efeito entre as partes litigantes. Mas neste caso da ação da Procuradora-Geral da República, junto ao STF, contra o decreto de indulto, aí o efeito a todos atinge (erga omnes), porque proferido pela Suprema Corte em ação subscrita pela PGR. Tanto a ação proposta quanto as decisões são difusas.
Portanto, se a liminar da ministra-presidente atendeu aos pedidos formulado na petição inicial, faltou o principal que era declarar inconstitucional o artigo que beneficiou os condenados por crimes de corrupção contra o erário e o patrimônio nacionais, que a todos os brasileiros pertencem, ainda que este específico pedido não constasse da petição da doutora Raquel Dodge.
PRESIDENTE NÃO LEGISLA – E mais: presidente da República não pode legislar. No máximo, expedir Medida Provisória, instrumento inaplicável para indultar e comutar penas por ocasião do Natal. Para tal fim, só o decreto serve. E decreto algum pode alterar a lei, para mais ou para menos. Dela, da lei, nada pode retirar ou acrescentar, mas apenas regulamentar.
E desde quando réu apenado definitivamente — que agora por este decreto pode estar condenado a 40, 50, 60 e muitos anos mais — pode ganhar a liberdade desde que tenha cumprido 1/5 da pena? Desde quando condenado que tenha neto com idade de até 14 anos pode estar isento do cumprimento da pena e ser posto na rua? Estas exceções só o Poder Legislativo pode autorizar através da edição de lei. Nem o Executivo tem competência para tanto. Somente o Congresso Nacional pode legislar sobre Direito Penal, Processual Penal, Civil, Processual Civil, Comercial, etc. etc…
Declarar a inconstitucionalidade foi o que faltou na decisão da ministra-presidente.

29 de dezembro de 2017
Jorge Béja

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