"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sábado, 25 de novembro de 2017

A DANÇA DOS CALHORDAS

Ao lado do teatro e da música a dança é uma das três principais manifestações cênicas que o homem pratica desde a pré-história, surgindo em grupo como rituais religiosos de súplica ou agradecimento. Quando perdeu o caráter só religioso e adiante deixou de ser considerada profana, com o Renascimento, chegou até aos nossos dias como uma expressão absoluta de liberdade e de completa autonomia sem rígidas regras, cujos temas são, na essência, entregues a todos para celebrar a vida.

Os povos dançaram para rezar, para demonstrar sua força e supremacia, para revelar seus sentimentos, para guardar sua cultura através da arte visual, porém a história das civilizações não diz que estas cultuaram a dança como expressão do maligno e da torpeza.

É diferente de se dizer que a dança do mal nunca existiu. Recordo a dança das bruxas na Idade Média da qual hoje decorrem a exortação ao tinhoso e os rituais das missas negras. Lembro agora da dança coreografada, nos guetos e nas favelas, pelos sanguinários do tráfico de armamento e de drogas com suas armas pesadas, e indignado comparo aquele bailado aterrador às desafiadoras dancinhas dos bandidos da política, com as quais rindo às escancaradas, sapateiam sobre a vida e a morte de uma legião de desvalidos que produziram nas últimas décadas, por conta de um nefando projeto de poder.

Alguns dias atrás circulou pela rede mundial dos computadores um vídeo, filmado de longa distância por um anônimo, que exibia o Deputado Estadual Jorge Picciani, Presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, o mesmo que o povo fluminense reconhece como um dos caciques políticos mais corruptos e indecorosos, dançando junto à janela de seu palácio de bilionário com um copo na mão ao escarnecer de uma prisão meteórica, depois de ter sido verdadeiramente resgatado em um carro oficial por sua quadrilha, numa desafiadora afronta ao Poder Judiciário e à sociedade de um modo geral.

À vista de tudo que vem acontecendo no Brasil nem estou conferindo tanta importância ao procedimento deste mafioso, que a carantonha obscena deveria ser proibida para menores de 30 anos, até porque toda a atual cúpula da política do Rio de Janeiro já foi longe de mais e fatalmente acabará atrás das grades, só não sei se por muito tempo se for socorrido por qualquer “Mandarim Solta Facínora” do STF.

O que mais me incomoda com tal dança debochada é que ela não denuncia um fato isolado próprio de um cafajeste, mas um sintoma emblemático do espírito que domina nossa classe política ou o que é pior, a índole dos nossos atuais representantes. Aqui esta dança tripudia sobre o sentimento do cidadão de bem. Olhem para os antecedentes e suas motivações.

Aí por volta de 2006, a ex-deputada federal pelo PT-SP, Ângela Guadagnim, levantou-se da cadeira na Câmara de Deputados e, sacudindo os braços, saiu bailando pelo plenário – episódio que ficou conhecido como a “dança da pizza” – para comemorar a absolvição do colega, também petista, Deputado João Magno de Minas Gerais, que escapou de ter seu mandato cassado depois de confessar que recebeu milhões no esquema do “Mensalão do PT”. Graças às redes sociais o episódio se espalhou como vírus e a petista idiota nunca mais voltou para o Parlamento.

Recentemente, também, o bandoleiro e gerente geral do Mensalão, José Dirceu, que implorou covardemente em Juízo ser colocado em prisão domiciliar por conta de uma alegada velhice precoce e de um precário estado de saúde, surgiu “num vídeo da rede” se rebolando todo numa festa particular regada com muita bebida e total desfaçatez.

Com igual procedimento vergonhoso e sarcástico, o Deputado Carlos Marun do PMDB-MS, líder da tropa de choque de Temer e de sua quadrilha, também Relator da CPI mista da empresa JBS dos irmãos Batista – instaurada para atingir a PGR e os Promotores que atuam na “Operação Lava Jato” – surge em outro flagrante que toda a imprensa alardeou, dançando para comemorar, no mesmo Plenário da Câmara, o arquivamento do inquérito instaurado, na Suprema Corte, contra o Presidente Temer e dois de seus Ministros de Estado, por crimes de obstrução da Justiça e organização criminosa. O prêmio por tanta petulância certamente chegará em forma de nomeação para algum Ministério. Quem viver verá.

Conquanto não tenha visto o ex-presidente José Sarney balançando o corpo (embora não duvide nem um pouco que a tanto já tenha chegado), dele se viu um comportamento do mesmo jaez, quando confrontado pela acusação sobre o uso dos helicópteros e dos jatinhos da FAB para atender interesses particulares. Na ocasião, fazendo-se de ofendido, gritou pela imprensa que se dava sim a este direito porque muito havia feito por nossa gente. Pode? Nesta toada, o Réu no “Petrolão” - senador Renan Calheiros - mandou às favas o Oficial de Justiça da Suprema Corte que vinha notificá-lo da decisão do STF de suspendê-lo da função de Presidente do Senado, porque detendo um mandato popular, esteve sempre certo de que aquela “casa de tolerância” não permitiria que a Justiça o alcançasse efetivamente. Assistidos pela passividade de todos nós, ambos se balouçaram e ainda se sacodem despudoradamente, por assim dizer, nos salões deste baile medíocre chamado de República.

A atenção e o repúdio devidos a esses acontecimentos se justificam porque guardam uma motivação comum indelével: os dançarinos e todos os seus pares estão convictos que um dia terão seus mal feitos esquecidos, ainda que tenham que entregar um pouco do muito que do povo roubaram, porque os esquemas aos quais pertencem, quer sejam quadrilhas, bandos, confrarias ou partidos políticos, não permitirão que sejam destruídos, tal como hoje ocorre com Lula e o PT, pelos quais combatem os asseclas e a militância fundamentalista.

Ou nos livramos dessa gente ou eles continuarão dançando sobre a cova dos brios da Pátria Brasileira, já feridos de morte.


25 de novembro de 2017
Jose Mauricio de Barcellos ex Consultor Jurídico da CPRM-MME é advogado.

Nenhum comentário:

Postar um comentário