Em meio à abundância de escândalos no dia a dia da política nacional, há notícias que demonstram a força da chamada “Operação Abafa”, destinada a inviabilizar a fase final da Lava Jato, exatamente como ocorreu há 20 anos na Itália com a famosa Operação Mãos Limpas. A suposta falta de provas, alegada pelo relator do Tribunal de Justiça de Minas Gerais para inocentar o ex-governador Eduardo Azeredo, e a mesma falta de provas, usada pela Polícia Federal para arquivar um processo contra a ex-presidente Dilma Rousseff, eis dois exemplos de que a impunidade dos detentores do poder ainda tem cartas na manga e não será vencida com facilidade, apesar do esforço da chamada República de Curitiba, que continua em expansão e já tem embaixadas em Brasília, no Rio de Janeiro e em muitas outras capitais e cidades de expressão.
A primeira notícia informou que, em Belo Horizonte, o desembargador Alexandre Victor de Carvalho pediu a absolvição do ex-governador Eduardo Azeredo no processo do mensalão tucano. Foi um parecer surpreendente, porque o inquérito do Supremo já pedira a condenação dele, que acabou pegando 20 anos e 10 meses na primeira instância, por peculato e lavagem de dinheiro.
RECORDAR É VIVER – Azeredo era deputado federal, ia ser condenado pelo Supremo. Em 2014 renunciou ao mandato, para perder o foro especial e fazer o processo ser julgado em Minas Gerais, onde foi governador e conhece nove entre cada dez desembargadores.
Acontece que na primeira instância não houve refresco e a juíza Melissa Pinheiro Costa Lage decretou a condenação do réu a 20 anos e dez meses de prisão pelo esquema de corrupção que teve objetivo de financiar sua fracassada campanha à reeleição em 1998.
Azeredo recorreu ao Tribunal de Justiça e o relator Alexandre Victor de Carvalho, surpreendentemente, pediu absolvição, alegando que não havia provas que ligassem o ex-governador aos crimes praticados. “Não restaram apuradas ações específicas praticadas pelo acusado. […] A denúncia é inepta já que não descreve satisfatoriamente sua participação nos fatos” Segundo o relator, o Ministério Público fez suposições pelo fato de o ex-governador ter sido beneficiado.
NÃO HÁ PROVAS – Sobre o peculato, o desembargador diz que não havia provas da participação de Azeredo, mas mesmo se existissem, ele não poderia ser condenado sem que os verdadeiros autores (os dirigentes das estatais) fossem responsabilizados. E, como os processos foram desmembrados, as provas sobre os demais réus não estavam na ação penal sobre Azeredo. Quer dizer, com o desmembramento, apertem os cintos, as provas sumiram…
Mas ainda há juízes em Belo Horizonte e o desembargador Pedro Vergaro, revisor do caso, votou pela condenação, apenas reduzindo a pena de prisão em nove meses, e o desembargador Adilson Lamounier acompanhou seu voto. Resultado: condenação por 2 a 1, a 20 anos de prisão.
FILHO DO NEPOTISMO – O relatório do desembargador Alexandre Victor de Carvalho causou estranheza e reviveu seu passado tenebroso, pois em 2011 foi acusado de ter empregado em seu gabinete uma funcionária fantasma, retendo para si parte do salário dela de 7.500 reais mensais, e a Corte Superior do Tribunal de Justiça aprovou a abertura de processo disciplinar contra ele, por 17 votos a 8.
A investigação não deu em nada, mas serviu para lembrar a trajetória de favorecimento que marcou sua carreira na magistratura. Alexandre Victor de Carvalho é filho do desembargador aposentado Orlando Adão Carvalho, ex-presidente do Tribunal de Justiça de Minas. Graças ao pai, conseguiu se tornar membro do Tribunal de Alçada, pelo quinto constitucional, sem jamais ser aprovado em concurso para juiz. Depois, em março de 2005, Alexandre foi eleito desembargador, em sessão presidida pelo próprio pai, vejam a que ponto chega a Justiça neste país.
DENÚNCIA AO CNJ – Em 2009, o procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, enviou denúncia ao Conselho Nacional de Justiça sobre corrupção no Tribunal de Justiça de Minas Gerais na gestão do desembargador Orlando Adão Carvalho, com uma lista de ilícitos e irregularidades, além de acusações de favorecimento a filhos de desembargadores e dirigentes de associações de classe, nas promoções de juízes.
Também não deu em nada. Na época, o Conselho Nacional de Justiça era presidido por Gilmar Mendes, mas deve ser apenas coincidência.
DILMA INOCENTADA – Outra matéria que causou surpresa revela que, também por falta de provas, a Polícia Federal decidiu pedir arquivamento do inquérito que investigou a ex-presidente Dilma e os ministros Francisco Falcão e Navarro Dantas, do Superior Tribunal de Justiça. O relatório da PF apontou que, feitas todas as diligências, não se confirmou o depoimento do ex-senador Delcídio Amaral e do seu ex-chefe de gabinete Diogo Ferreira. Eles denunciaram que Navarro Dantas fora nomeado ministro do STJ com a missão de libertar Marcelo Odebrecht.
De fato, assim que Navarro Dantas assumiu, a defesa de Odebrecht de imediato apresentou o recurso, que foi obrigatoriamente distribuído ao novo ministro, na forma do Regimento do STJ. Navarro cumpriu a missão e fez o parecer mandando libertar Marcelo Odebrecht, mas acontece que vazou a notícia da armação de Dilma e Francisco Falcão, presidente do STJ, a imprensa denunciou o golpe dois dias antes e o parecer de Navarro Dantas foi recusado por unanimidade.
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P.S. – Os depoimentos de Delcídio Amaral e Diogo Ferreira apenas confirmaram o que era público e notório. Às vésperas do julgamento, já se sabia que a nomeação do ministro tinha sido “armada” para libertar o empresário Marcelo Odebrecht. Mas parece que, de repente, testemunho não vale mais como prova, e o próprio parecer de Navarro Dantas já comprovava abundantemente o favorecimento ao empreiteiro. Mesmo assim, a PF não viu “indícios” de irregularidade. Foi muito estranho, para dizer o mínimo. Agora, vamos acompanhar como a Procuradoria-Geral da República vai se posicionar sobre mais essa iniciativa da “Operação Abafa”. (C.N.)
P.S. – Os depoimentos de Delcídio Amaral e Diogo Ferreira apenas confirmaram o que era público e notório. Às vésperas do julgamento, já se sabia que a nomeação do ministro tinha sido “armada” para libertar o empresário Marcelo Odebrecht. Mas parece que, de repente, testemunho não vale mais como prova, e o próprio parecer de Navarro Dantas já comprovava abundantemente o favorecimento ao empreiteiro. Mesmo assim, a PF não viu “indícios” de irregularidade. Foi muito estranho, para dizer o mínimo. Agora, vamos acompanhar como a Procuradoria-Geral da República vai se posicionar sobre mais essa iniciativa da “Operação Abafa”. (C.N.)
24 de agosto de 2017
Carlos Newton
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