"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

segunda-feira, 7 de julho de 2014

O FIM DO TRANSE MODERADO

          


 
Sarney não irá mais se candidatar. Como farão os 600 mil eleitores do Amapá – ou mesmo os maranhenses – sem a presença do senhor de bigode na urna eletrônica neste ano? Sair da política? “Não”, respondeu: “a política só tem porta de entrada”. Passaram governos, presidentes, crises internas e externas, moedas foram criadas e extintas, o Brasil foi parlamentarista, amargou uma ditadura, voltou ao presidencialismo e Sarney firme, surfando sempre.
 
José Ribamar é um vocacionado. Há outro nome na história do país que tenha passado 60 anos ininterruptos ocupando cargos públicos – e de destaque nacional? Nem José Bonifácio, nem Getúlio Vargas, nem dom Pedro II, que, coroado em 1831, sofreu o golpe republicano 58 anos depois. O Brasil contemporâneo tem no maranhense um símbolo, é uma trajetória histórica e outra biográfica que se imbricam.

Alguns destaques interessantes da ficha: quando se elegeu pela primeira vez suplente de deputado federal, no distante 1955, seu partido era o PSD do presidente que chegaria ao Catete no ano seguinte, JK. Em 1965, venceu a disputa pelo governo do Maranhão com votação expressiva. Ainda era do PSD, mas, como o regime militar implantara o bipartidarismo, preferiu a Arena ao MDB.

ALGO NO AR

Na sigla governista dos militares foi ficando, já como senador por seu Estado natal. Chegou a presidir a Arena em 1979. Mas, já no começo da década de 80, sentiu um cheiro novo no ar e rompeu com o regime.
Já no PMDB, como representante moderado que era (sempre sendo), foi escolhido para compor a chapa com Tancredo. Talvez sua presença tenha sido essencial para a vitória no Colégio Eleitoral.

O destino pregou uma das maiores peças ao país em abril 1985, e a República caiu no colo do predestinado. O resto da história quase todo mundo acompanhou.

Depois de lutar contra a hiperinflação, pôr na rua os fiscais da Sunab (ligue 199, lembra?), trocar os ministros da Fazenda com a mesma velocidade com que se esgotavam seus planos artificiais, depois de anunciar a moratória em 1987, Sarney estacionou sua carreira no Amapá – que inventou para, nele, se eleger senador, sempre pelo PMDB (claro).

Em 2009, em uma das tantas vezes que presidiu o Senado, ele viveu sua pior crise pessoal. O país se cansara de Sarney, avatar da velha política, casuística e adesista. Foi Pedro Simon, em um discurso memorável da tribuna, quem pediu a renúncia do correligionário, que, ao contrário de Getúlio, estava “saindo da história para cair na vida”.

Sarney aguentou o tranco incrivelmente. Quem conseguiu governar democraticamente o país após 25 anos de ditadura militar e a morte repentina do presidente eleito não seria derrubado por uma dúzia de denúncias. Agora, pediu para sair. Porque quer, não porque alguém mandou. Poder é isso.

As imagens impactantes do discurso de sua posse no governo maranhense foram captadas por Glauber Rocha.
O curta “Maranhão 66” foi descartado como peça de propaganda. Mas aquelas cenas foram aproveitadas depois em “Terra em Transe”. Nenhuma coincidência ou alegoria para retratar tal personagem seria mais propícia.

(transcrito de O Tempo)

07 de julho de 2014
João Gualberto Jr.

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