Estou convencida de que vivi os anos dourados do meu querido Rio de Janeiro. Nasci na Gávea numa bela casa de dois andares onde em cima morava minha avó materna e embaixo a minha família: meus pais e meus dois irmãos. A casa, na rua Major Rubens Vaz, ainda existe e quem a comprou foi o psicanalista Pedro Pellegrino que a conservou igualzinha na sua fachada externa. Na minha infância esta rua só tinha casas e nós crianças brincávamos uns nas casas dos outros.
A nossa casa tinha um belo quintal e lembro que fazíamos pseudos cigarros com os talos das samambaias, imitando no gestual os adultos que fumavam. Tinha também um belo caramanchão onde vovó, costumava se balançar na rede e nos contar histórias do seu tempo. Mesmo nos mudando dessa casa continuamos a frequentá-la com assiduidade, pois vovó continuou lá morando juntamente com a família do meu tio até o seu falecimento.
EM LARANJEIRAS – Nos mudamos para Laranjeiras para o edifício Paulo Afonso/Zacatecas, onde moro até hoje e a minha infância e adolescência foi uma verdadeira delicia. Como eu era menina, entre dois irmãos, logo logo aprendi todas as brincadeiras de meninos, como bola de gude, carniça, bandido e mocinho, andar com desenvoltura pelos muros do prédio e por aí vai. Até hoje tenho uma amiga que me diz que morria de inveja de mim, pois adoraria andar nos muros e a mãe dela não deixava, porque dizia que era coisa de moleque.
Tinha também a minha turma de meninas e íamos quando crianças ao Fluminense aprender a nadar e qdo adolescentes às festinhas dançantes ao som do Ray Conniff. No Flu vi artistas de perto como Tony Curtis, Bill Haley, Johnny Mathis, Nat King Cole, Billy Eckstein, Sarah Vaughn, além de João Gilberto e Ellis Regina. Nossa turminha de meninas, quase todas da mesma faixa etária, brincávamos de roda, amarelinha, bambolê, corda simples e dupla, jogo de pedrinhas, bola na parede, aquele que falava: ordem, seu lugar, sem rir, sem falar, um pé, o outro, uma das mãos, a outra, bate palma, pirueta, cruzado, trás pra frente, quedas. Como consegui me lembrar disso?
AVANT PREMIERE – Aos domingos era sagrado ir, após à missa, às matinês do avant première no cinema São Luiz que eram às 10.30m. Lembro que a turma dos mais velhos ia só pra fazer bagunça, ao ponto de jogar uma galinha dos andares superiores para a plateia e era aquela gritaria e alvoroço.
À tarde dos domingos, íamos um grupo grande, na companhia da avó de uma amiga, de bonde à Cinelandia, pois ali existiam vários cinemas, como Metro Passeio, Plaza, Palácio, Pathé, Capitólio, Vitória, Odeon, Império. Terminado o filme, fechávamos a tarde lanchando na Sorveteria Americana, na Rua Senador Dantas, ou então comendo uma massa na Spaguetilandia.
Havia também os seriados no Cineac Trianon, que papai nos levava aos domingos também pela manhã.
TUDO MUDOU – Hoje, no mesmo prédio em que moro, não vejo mais crianças e jovens brincando no pátio, não vejo mais as mães descendo com seus carrinhos de bebê, não vejo mais meninas cantando cantigas de roda ou pulando corda, não vejo mais a amiga chamando pela outra para descer, não vejo as brincadeiras de pique-esconde, de bandeira, de estátua, de corrupio, nada, nada disso.
Hoje, o mundo virou tecnológico e o império da droga grassou a bandidagem, e nós, as pessoas honestas, estamos atrás das grades onde moramos, enquanto os bandidos tomaram conta das ruas.
04 de setembro de 2018
Celina Studart Lavander
Nenhum comentário:
Postar um comentário