O Natal perdeu a delicadeza antiga. Não temos mais chaminés nem ceias transcendentais. Hoje, Papai Noel vem com as renas de um Polo Norte que está derretendo pelo efeito estufa. Hoje, no presépio de Belém, perto da manjedoura do Menino Jesus, explodem homens-bomba berrando: “Feliz Natal, cães infiéis”. Estranho destino da humanidade: a morte no mesmo lugar no nascimento, o fim da civilização na mesma região onde começou.
Todo ano eu acabo escrevendo sobre o Natal. Todo ano sinto a estranheza dessa data que sempre me soou inverossímil como um conto de fadas. Toda aquela alegria com data marcada, toda aquela mansidão fraternal que une desafetos do ano todo.
Mas, neste ano, o negócio ficou pior.
No Brasil, como comemorar um Natal à beira do abismo? Sim. Passamos o ano todo diante de más notícias e, de repente, noite feliz, noite de paz, rabanadas, castanhas e perus? Que peru? Comê-lo-emos ou seremos comidos? Estamos assistindo a uma desmontagem do país e de repente ficamos felizes? Este Natal chega com o bruto agravamento da crise brasileira. É terrível, mas estamos constatando que talvez o Brasil seja impossível de salvar. Talvez em nossa história tenham se consolidado erros que se somam numa trama maldita, numa mixórdia que determinará para sempre nosso futuro. Talvez não tenhamos futuro. Talvez estejamos descobrindo que nossos erros presentes e nosso atraso são eternos. Como conciliar divergências e os interesses mais sujos da política com a necessidade de reformas administrativas e sociais? O Executivo não quer ou não tem poder para dialogar com o Congresso entre chantagens e oportunismo.
Estes últimos 13 anos mostram a infinita capacidade de errar de um governo de gente que quer se vingar e refazer o sonho maluco de 1963, quando jovens achavam que iam conquistar o socialismo sem armas e com a ajuda do Jango, o presidente da República. Naquela época havia uma romântica ingenuidade, uma beleza na coragem e no martírio, mas, com o passar do tempo, só restou o delírio daquele sonho ideológico que nos moveu, ficaram só os maus motivos, ocultos sob a luz da coragem. E todos foram adotados pelo PT e pelos aliados. Com eles, só restaram os antigos defeitos.
Quais?
Por exemplo, daquela época sobrou o desprezo pela democracia e pela sociedade civil (mesmo se falando em nome dela), continuou o sonho de um grande Estado provedor, ficou o velho rancor contra os empreendedores que fizeram o país, ficou o ódio e o simplismo de achar que a história tão complexa hoje é apenas a luta entre opressores e oprimidos, ficou a santificação da pobreza como prova de pureza de alma, ficou o despreparo político daqueles tempos quando o marxismo-leninismo era apenas um pretexto, pois ninguém lera nada. A ignorância era louvada como um direito dos “guerreiros do povo brasileiro”, que, por tamanha coragem, não precisavam estudar.
Ficou no ar a louvação que Lula fez da própria incultura, ficou a arrogância com que eles se sentem superiores a nós – “burgueses alienados”. Continuou a incompetência daqueles tempos, quando, além de diagnósticos esquemáticos sobre o Brasil, ninguém sabia como agir. Ficou (e se desenvolveu galhardamente) a tese de que é permitido expropriar (eufemismo para roubar) grana de empresas públicas para utopias ridículas. Ficou o ódio estúpido ao mercado, que é a expressão da vida social desde as cavernas, ficou o mesmo ideal babaca que embalou os bolivarianos com os resultados que vimos na Venezuela e na Argentina, ficou a teimosia vista como obstinação, ficou a tese de que a mudança de ideias é um desvio da linha justa, chamado de aventureirismo ou sórdido revisionismo. Mudar é trair. Ficou a burrice de quererem governar um país capitalista com métodos “socialistas”.
Ficou visível que o DNA dessa gente que nos ocupou é imutável, mesmo com acrobacias mentais de alguns intelectuais orgânicos para justificar essa cag#*&, ficou o desejo vagabundo de substituir a realidade por outra realidade que não sabem qual é, ficou a preguiça de administrar como sendo uma coisa também menor, comparada às tarefas “revolucionárias”. Ficaram os olhos iluminados pela crença no absurdo.
Esse esquematismo ideológico, somado aos obstáculos legislativos, somado à imensa estupidez popular, somado à falta de educação e o analfabetismo funcional, é o contrário de tudo que devia ser feito. Já estão aí os sinais.
Dá para prever.
A chegada de Nelson Barbosa ao Ministério da Fazenda já prepara a volta da fracassada “nova matriz econômica”, com a finalidade de criar um novo populismo de consumo, mesmo quebrando o Estado, para enrolar o povo e salvar o governo até 2018. Os “meios” errados nos levarão a “fins” errados.
Os gastos públicos não serão cortados e aumentarão muito.
A inflação vai continuar crescendo, pois eles não ligam para a “inflação neoliberal”. A economia continuará a ser ditada pela Dilma, com o obediente Nelson Barbosa batendo cabeça.
A Lei de Responsabilidade Fiscal será desmoralizada definitivamente.
Ou seja, leitor, desculpe o mau jeito, mas abandone toda esperança.
Provavelmente não haverá impeachment porque a engrenagem do medo e do oportunismo cordial entre partidos criam um sarapatel de obstáculos que paralisam tudo.
Claro que Dilma jamais renunciará. Não haverá ajuste fiscal nenhum. Não haverá reforma alguma nem na Previdência, nem em nada, o desemprego vai aumentar, tudo que foi modernizado há 15 anos será jogado para o passado mais escroto dessa matriz econômica que nos empobrece (em nome dos pobres), a conjunção astral de forças do “mal” está a nos condenar a um futuro imutável.
O Brasil vai voltar para seu estado primitivo, alheio à modernidade internacional. Já somos considerados o país mais autodestrutivo do mundo. Sinto muito, amigos, mas acho que nada vai melhorar. Nada. Este Natal é a porta para um ano desastroso.
Mas há uma vitória: Dilma está realizando seu sonho de ex-guerrilheira – acabar com o capitalismo. E ela está conseguindo.
22 de dezembro de 2015
Arnaldo Jabor
Todo ano eu acabo escrevendo sobre o Natal. Todo ano sinto a estranheza dessa data que sempre me soou inverossímil como um conto de fadas. Toda aquela alegria com data marcada, toda aquela mansidão fraternal que une desafetos do ano todo.
Mas, neste ano, o negócio ficou pior.
No Brasil, como comemorar um Natal à beira do abismo? Sim. Passamos o ano todo diante de más notícias e, de repente, noite feliz, noite de paz, rabanadas, castanhas e perus? Que peru? Comê-lo-emos ou seremos comidos? Estamos assistindo a uma desmontagem do país e de repente ficamos felizes? Este Natal chega com o bruto agravamento da crise brasileira. É terrível, mas estamos constatando que talvez o Brasil seja impossível de salvar. Talvez em nossa história tenham se consolidado erros que se somam numa trama maldita, numa mixórdia que determinará para sempre nosso futuro. Talvez não tenhamos futuro. Talvez estejamos descobrindo que nossos erros presentes e nosso atraso são eternos. Como conciliar divergências e os interesses mais sujos da política com a necessidade de reformas administrativas e sociais? O Executivo não quer ou não tem poder para dialogar com o Congresso entre chantagens e oportunismo.
Estes últimos 13 anos mostram a infinita capacidade de errar de um governo de gente que quer se vingar e refazer o sonho maluco de 1963, quando jovens achavam que iam conquistar o socialismo sem armas e com a ajuda do Jango, o presidente da República. Naquela época havia uma romântica ingenuidade, uma beleza na coragem e no martírio, mas, com o passar do tempo, só restou o delírio daquele sonho ideológico que nos moveu, ficaram só os maus motivos, ocultos sob a luz da coragem. E todos foram adotados pelo PT e pelos aliados. Com eles, só restaram os antigos defeitos.
Quais?
Por exemplo, daquela época sobrou o desprezo pela democracia e pela sociedade civil (mesmo se falando em nome dela), continuou o sonho de um grande Estado provedor, ficou o velho rancor contra os empreendedores que fizeram o país, ficou o ódio e o simplismo de achar que a história tão complexa hoje é apenas a luta entre opressores e oprimidos, ficou a santificação da pobreza como prova de pureza de alma, ficou o despreparo político daqueles tempos quando o marxismo-leninismo era apenas um pretexto, pois ninguém lera nada. A ignorância era louvada como um direito dos “guerreiros do povo brasileiro”, que, por tamanha coragem, não precisavam estudar.
Ficou no ar a louvação que Lula fez da própria incultura, ficou a arrogância com que eles se sentem superiores a nós – “burgueses alienados”. Continuou a incompetência daqueles tempos, quando, além de diagnósticos esquemáticos sobre o Brasil, ninguém sabia como agir. Ficou (e se desenvolveu galhardamente) a tese de que é permitido expropriar (eufemismo para roubar) grana de empresas públicas para utopias ridículas. Ficou o ódio estúpido ao mercado, que é a expressão da vida social desde as cavernas, ficou o mesmo ideal babaca que embalou os bolivarianos com os resultados que vimos na Venezuela e na Argentina, ficou a teimosia vista como obstinação, ficou a tese de que a mudança de ideias é um desvio da linha justa, chamado de aventureirismo ou sórdido revisionismo. Mudar é trair. Ficou a burrice de quererem governar um país capitalista com métodos “socialistas”.
Ficou visível que o DNA dessa gente que nos ocupou é imutável, mesmo com acrobacias mentais de alguns intelectuais orgânicos para justificar essa cag#*&, ficou o desejo vagabundo de substituir a realidade por outra realidade que não sabem qual é, ficou a preguiça de administrar como sendo uma coisa também menor, comparada às tarefas “revolucionárias”. Ficaram os olhos iluminados pela crença no absurdo.
Esse esquematismo ideológico, somado aos obstáculos legislativos, somado à imensa estupidez popular, somado à falta de educação e o analfabetismo funcional, é o contrário de tudo que devia ser feito. Já estão aí os sinais.
Dá para prever.
A chegada de Nelson Barbosa ao Ministério da Fazenda já prepara a volta da fracassada “nova matriz econômica”, com a finalidade de criar um novo populismo de consumo, mesmo quebrando o Estado, para enrolar o povo e salvar o governo até 2018. Os “meios” errados nos levarão a “fins” errados.
Os gastos públicos não serão cortados e aumentarão muito.
A inflação vai continuar crescendo, pois eles não ligam para a “inflação neoliberal”. A economia continuará a ser ditada pela Dilma, com o obediente Nelson Barbosa batendo cabeça.
A Lei de Responsabilidade Fiscal será desmoralizada definitivamente.
Ou seja, leitor, desculpe o mau jeito, mas abandone toda esperança.
Provavelmente não haverá impeachment porque a engrenagem do medo e do oportunismo cordial entre partidos criam um sarapatel de obstáculos que paralisam tudo.
Claro que Dilma jamais renunciará. Não haverá ajuste fiscal nenhum. Não haverá reforma alguma nem na Previdência, nem em nada, o desemprego vai aumentar, tudo que foi modernizado há 15 anos será jogado para o passado mais escroto dessa matriz econômica que nos empobrece (em nome dos pobres), a conjunção astral de forças do “mal” está a nos condenar a um futuro imutável.
O Brasil vai voltar para seu estado primitivo, alheio à modernidade internacional. Já somos considerados o país mais autodestrutivo do mundo. Sinto muito, amigos, mas acho que nada vai melhorar. Nada. Este Natal é a porta para um ano desastroso.
Mas há uma vitória: Dilma está realizando seu sonho de ex-guerrilheira – acabar com o capitalismo. E ela está conseguindo.
22 de dezembro de 2015
Arnaldo Jabor
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