Já tinha batido super mal em meus ouvidos essa história dos promotores do Paraná descreverem como “vítima” essa Petrobras que se deixa gostosamente roubar na denuncia oferecida ontem contra 36 envolvidos na roubalheira do século. Essa Petrobras que deixa-se roubar mas é implacável com todos quantos traem a “omerttá” que se exige dos “da casa” e ousam denunciar de dentro essa bandalheira, como foi o caso dessa Venina Velosa da Fonseca, demitida em 19 de novembro, agora, que está hoje no Valor mostrando farta documentação que prova que todo mundo foi avisado na atual diretoria blindada por dona Dilma desde pelo menos 2008, não só das falcatruas já conhecidas graças à Lava Jato mas também de outras que ela teve oportunidade de descobrir no exílio que pagou em Cingapura por ter insistido candidamente em pedir providências contra a ladroagem a Sérgio Gabrielli, Graça Foster e, finalmente, o fresquíssimo Jose Carlos Cosenza, substituto de Paulo Roberto Costa.
A história dela é de longe a mais arrasadora publicada até agora pois dá provas de como os criminosos não apenas perseveraram no crime como desdobraram-se em mais e mais manobras para seguir praticando-os enquanto a polícia corria atrás deles, o Ministério Público estava enfiado dentro da empresa e o país “se convulsionava”, para usarmos a expressão do Procurador Geral, Rodrigo Janot, com o que lhe ia sendo dado a conhecer.
Para a denunciante, abordagens na rua, à noite, "arma na cabeça", ameaças à sua vida e às de suas filhas...
Não ha limites para essa gente e nada autoriza ilusões quanto a que tipo de afronta às instituições e ao próprio regime eles serão capazes de recorrer para continuar eternamente em condições de se lambuzar.
Daí o grau de alarme que me sobe ao constatar que todos os vícios e mentiras fundamentais do “sistema” que roubou o futuro à minha geração aparecem reafirmados, de alguma forma, neste que tantos querem que venha a ser o ataque que finalmente lhe quebrará as pernas.
Estão lá, indisfarçavelmente presentes, não só no que vem das autoridades judiciárias envolvidas mas também no modo como a imprensa descreve o que se tem passado, um ranço primitivo de “luta de classes” no tratamento inversamente “privilegiado” dispensado aos empreiteiros ladrões face aos políticos e funcionários ladrões ainda que estejam todos democraticamente irmanados no mesmíssimo crime; está lá a intocabilidade dos amigos do rei transfigurada no absoluto silêncio em relação aos políticos de cujos proventos os empreiteiros faturam meras comissões; está lá o privilégio dos amigos dos amigos do rei na persistente blindagem dos funcionários envolvidos, exceção feita aos “traidores” que denunciam a roubalheira que, estes sim, são execrados.
Resume todos esses maus sinais a severidade dos juízes e procuradores autorizados a lidar com a “gentalha” aqui de fora do Estado posta ao lado do silêncio obsequioso, só interrompido por ordens de soltura e proibições de acesso aos fatos, dos juízes encarregados de julgar e acusar as “excelências”, ou seja, os pau-mandantes sem o comando dos quais rigorosamente nada desse monumento ao escracho poderia sequer sonhar com instalar-se no seio da República e em todas as intersecções dela com o dinheiro grosso.
E tudo isso apesar de já nem os “da casa” merecerem o perdão dos ladrões pois há ramos da quadrilha situados nas mais altas instâncias do partido no poder especializados em roubar a poupança dos funcionários aposentados depositadas em fundos de pensão, em golpear empregados do Estado cooperados para comprar casa própria e até, em tungar antigos “sem-terra” contemplados com lotes que hoje estão no meio de áreas valorizadas.
Tudo isso o país e sua imprensa tragam, não direi já sem o escândalo que seria de esperar, mas sem sequer identificar tais “nuances” claramente como o que são, o que autoriza os criminosos a negar o crime diante da prova do crime ou até, a apresentar a prova do seu próprio crime como uma espécie de álibi, como se estivéssemos vivendo um sonho sem sentido.
Sim, ok, dizem que a coisa virá por etapas sucessivas e que chegará a vez das matrizes depois da execração pública e das condenações das filiais, e eu acredito mesmo que entre os supostos paladinos do MP haja paladinos de fato. Mas a persistência desse “respeito” a essa hierarquia dos bandalhos não me desce pela garganta sem engasgar.
Não é tanto a defesa intransigente dos diretores que se deixaram roubar porque isso é bandido segurando as pontas de bandido. Mas é o condenado que continua sendo “excelência” até durante as seções de acusação e a leitura da sentença; é essa rigorosa “ordem na fila” dos bandidos segundo a sua “estirpe”, como nos tempos do feudalismo, que me dizem que os poucos meses de prisão para os zés dirceus e genoínos contra os 40 anos dos marcos valérios podem não ser a última bofetada na cara dos brasileiros que ganham o pão com o suor do seu rosto.
Queira deus, mesmo não sendo brasileiro como já provou que não é, que desta vez eu esteja errado!
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